Doze trabalhadores foram resgatados em condições análogas às de escravo em uma mina de caulim, no município de Salgadinho, Sertão da Paraíba. O resgate aconteceu durante uma Operação simultânea do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, que começou na última sexta-feira e só foi encerrada no final da tarde dessa quarta-feira (15).
Outros 19 trabalhadores foram resgatados de uma fazenda em Santa Luzia do Tide, no Maranhão e dois refugiados venezuelanos de uma fazenda em Mucajaí, Roraima. Ao todo, a operação resgatou 33 trabalhadores nos três Estados, justamente na semana dos 131 anos da Lei Áurea (13 de maio). Grande parte dos resgatados eram negros, de baixa renda e não tinham sequer o ensino fundamental completo.
“Nessa atividade de retirada manual de caulim estou há mais de 30 anos”, revelou um dos trabalhadores resgatados, que o chamaremos de ‘José’. Aos 59 anos, não concluiu o ensino fundamental e não tem carteira de trabalho assinada.
A jornada é puxada na extração do caulim, entre seis e sete horas por dia. “Não trabalha no turno da tarde porque a turma não aguenta, o trabalho é muito pesado”, acrescentou José. A maior parte da jornada é dentro da mina. “O lanche e o intervalo são feitos dentro do buraco da mina mesmo”, disse.
Além do risco iminente de acidente dentro das minas, os garimpeiros não têm as mínimas condições de trabalho. “Se precisar faz necessidade no mato mesmo”, explicou outro garimpeiro que, aos 54 anos, nunca teve a sua carteira de trabalho assinada, informa publicação do MPT.
Risco embaixo da terra
Em poços abertos no solo, os garimpeiros – sem proteção alguma – eram descidos por cordas e trabalhavam a aproximadamente 30 metros de profundidade (equivalente à altura de um prédio de 10 andares). Nas chamadas banquetas de caulim, com pouca iluminação, muito calor e pouco oxigênio, trabalhadores conviviam, diariamente, com o risco iminente de desabamento e morte. Eles contaram que no período de chuva, as escavações na mina têm que parar porque aumenta muito o risco de deslizamento de terra e acidentes.
Sem EPIs
Segundo o procurador do MPT-PB Marcos Almeida – que acompanhou a operação na Paraíba – os trabalhadores estavam em condições degradantes de trabalho. “Eles trabalhavam sem equipamentos de proteção individual e sem a menor segurança”, informou o procurador.
“Os trabalhadores estavam em banquetas ou galerias para extração de caulim, em atividade que, por si só, já é extenuante, em situação muito adversa e perigosa, sem a mínima condição de trabalho. Não se pode admitir situações de grave violação à dignidade do cidadão trabalhador”, acrescentou.
Os 12 trabalhadores resgatados na Paraíba são naturais ou residem nos municípios de Junco do Seridó, Passagem, Juazeirinho, Assunção e Salgadinho. Eles têm, em média, entre 30 e 60 anos.
De acordo com o procurador Marcos Almeida, não havia água potável, local para as refeições e nem banheiro no local. “Além de uma atividade altamente perigosa, eles ganhavam entre R$ 500,00 e R$ 600,00 por mês”, acrescentou o procurador.
Pagamento
Marcos Almeida informou que o responsável pela exploração dos trabalhadores teve que pagar as verbas rescisórias ao grupo. “Além disso, os trabalhadores resgatados também receberão o seguro desemprego”, disse.
A equipe de fiscalização na Paraíba foi composta por seis auditores fiscais do Trabalho, do Ministério da Economia, um procurador do Ministério Público do Trabalho, um defensor federal da Defensoria Pública da União e agentes da Polícia Rodoviária Federal.
Minério branco
O caulim é um mineral branco usado na fabricação de papel, na indústria de borracha, plásticos, pesticidas, rações, produtos farmacêuticos, cosméticos, entre outros.
Escravidão moderna
Atualmente, no Brasil, quatro elementos definem a chamada “escravidão contemporânea”: trabalho forçado (que envolve cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida do trabalhador) ou jornada exaustiva (levar o trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida).
1,7 mil
É o número de investigações em curso atualmente no MPT, no País, envolvendo o tema ‘Trabalho Análogo ao de Escravo’, conforme dados do MPT Digital (Gaia/Maio de 2019).