O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes fez uma provocação nesta sexta-feira (27) ao ministro Luís Roberto Barroso, ao dizer que de vez em quando o Supremo é uma “Corte que proíbe a vaquejada e permite o aborto”.
Em outubro do ano passado, por 6 a 5, o STF decidiu que uma lei estadual do Ceará que regulamenta a prática da vaquejada é inconstitucional. Naquele julgamento, Gilmar Mendes defendeu a constitucionalidade da lei cearense, enquanto Barroso se alinhou à corrente vencedora contra a vaquejada, ressalta o Estadão.
“Parte desse grupo que votou na vaquejada conduziu uma decisão que tentava introduzir o aborto no Brasil, dizendo que aborto até três meses, sem decisão do plenário, seria legítimo, num caso que discutia não o tema diretamente, mas excesso de prazo para pessoa que praticou aborto. A decisão poderia ter sido favorável à pessoa, pelo excesso de prazo, mas não precisava entrar no tema. Entrou no tema, porque se viu possibilidade de fazer maioria. De vez em quando nós somos esse tipo de Corte que proíbe a vaquejada e permite o aborto”, criticou Gilmar, durante conferência sobre perspectivas de reforma institucional, em Brasília.
A agenda oficial de Gilmar Mendes só foi divulgada na página do STF depois que o ministro já tinha participado do evento.
Em novembro de 2016, a Primeira Turma Turma do STF abriu um precedente ao entender que não é crime o aborto realizado durante o primeiro trimestre de gestação – independentemente do motivo que leve a mulher a interromper a gravidez. A decisão valeu apenas para um caso, envolvendo funcionários e médicos de uma clínica clandestina em Duque de Caxias (RJ) que tiveram a prisão preventiva decretada. Gilmar não participou do julgamento desse caso, por integrar a Segunda Turma.
Nesse julgamento, os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Rosa Weber se manifestaram no sentido de que não é crime a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre, além de não verem requisitos que legitimassem a prisão cautelar dos funcionários e dos médicos da clínica, como risco à ordem pública, à ordem econômica ou à aplicação da lei penal.
Os ministros Luiz Fux e Marco Aurélio Mello, que também compõem a 1.ª Turma, concordaram com a revogação da prisão preventiva por questões processuais, mas não se manifestaram sobre a descriminalização do aborto nos primeiros três meses de gestação.
LEGISLAÇÃO. Na avaliação de Gilmar Mendes, a legislação cearense sobre a vaquejada trouxe “regras para o tratamento dos animais”.
“Os movimentos em favor dos animais arguem a inconstitucionalidade desta lei e nós por maioria, eu votei contra [derrubar a lei], decidimos proibir a vaquejada. Isso gerou movimento nacional, todos viram que teria consequências em todo o Brasil. A vaquejada é muito forte no Nordeste. Por outro lado, estaríamos jogando essa prática na ilegalidade porque provavelmente não teria força coercitiva para impedir que essas práticas continuassem. Esse movimento foi tão forte que fez com que o Congresso aprovasse quase que por unanimidade uma emenda constitucional dizendo que, desde que respeitado determinados processos, a vaquejada é esporte nacional”, comentou Gilmar Mendes.
Procurado pela reportagem, o gabinete do ministro Luís Roberto Barroso não havia se pronunciado até a publicação deste texto.