Pistola na maleta
De acordo com Josenildo de Araújo, que desde 2005 tenta receber dinheiro de Julian, o ex-patrão sempre teve comportamento explosivo. Diz que Julian ameaçava quem falava em recorrer à Justiça para garantir direitos e que andava com uma maleta com uma pistola para intimidar a equipe. (Veja vídeo abaixo)
Ao tentar entrevistar ex-funcionários que movem ações contra Julian, pelo menos outros dois disseram ao BuzzFeed News ter receio de aparecer devido à fama do deputado eleito. O seu perfil agressivo, no entanto, não é novo para quem acompanha o noticiário político.
Ele já foi acusado por três vezes na Lei Maria da Penha. Duas por agressões à ex-mulher e uma à irmã (veja trecho do depoimento da ex-mulher à Justiça no link para outra reportagem no final deste texto). Os casos ocorreram entre 2013 e 2016.
Procurada pelo BuzzFeed News, a ex-mulher, Ravena, afirmou ter medo de possíveis reações de Gulliem e se negou a dar uma entrevista relatando sua separação, a situação de suas empresas e o processo da Maria da Penha.
Empresas em nome da mãe, da irmã e da mulher
Os casos de agressão, contudo, acabaram sendo retirados pelas vítimas. Amigos de Ravena que acompanharam os processos dizem que foram elas mudaram suas versões, isentando Julian e encerrando os inquéritos após apelos da mãe do deputado eleito, dona Maria Dalva Bezerra.
Enquanto a empresa de segurança GAT vinha apresentando problemas para pagar as dívidas, uma outra firma, a TMS, foi aberta ainda em 2004. Formalmente, as proprietárias são a mãe de Julian e Kamila Lemos, uma irmã do deputado eleito.
Em 2009, foi aberta a Perímetro, cuja dona formal era a então mulher de Julian, Ravena Coura. No abre e fecha de empresas, os contratos foram migrando: primeiro da GAT para a TMS, em nome da mãe e da irmã de Julian, e, depois, da TMS para a Perímetro, em nome da mulher.
Essa é uma das evidências de que, embora seus parentes figurem como proprietários, o dono oculto das empresas seria Julian, conforme relatos de ex-funcionários nos processos trabalhistas movidos contra as empresas.
Outra mulher, outra empresa
Durante a operação da Perímetro, Julian conheceu Manuela Ximenes, com quem manteve um relacionamento. Tal situação levou ao fim do casamento com Ravena, com quem tem dois filhos.
A desavença entre o casal desembocou nos casos da Lei Maria da Penha, e Ravena, após alegar ter sido agredida, pediu a separação e se recusou a seguir como dona cartorial da empresa Perímetro, que acabou abandonada.
Ao fim do casamento e da empresa Perímetro sucedeu-se a criação de uma empresa de segurança chamada M24, em 2013. A proprietária: Manuela Ximenes, a nova mulher de Julian. Ao menos, um dos contratos da Perímetro passou a ser executado pela M24.
E aí aparece o avô
Mais recentemente, e com a Justiça do Trabalho apertando o cerco contra Julian, um novo episódio de mudanças cartoriais surgiu na família do deputado eleito.
Além da abertura de empresas, o padrão da troca de proprietários se repetiu, dessa vez, com um terreno.
Apesar de os processos iniciais contra Julian terem como alvo ele mesmo e a GAT, não demorou para que a Justiça o colocasse no pólo passivo em ações na TMS e na Perímetro, da qual ele não é formalmente sócio, mas apontado por ex-funcionários como o verdadeiro dono.
Num dos poucos bens que já figuraram na vida familiar – oficialmente, Gulliem declarou à Justiça Eleitoral não possuir nenhum bem em seu registro de candidatura – surgiu um terreno localizado em Cabedelo, município colado à capital João Pessoa.
Ele foi comprado por sua ex-esposa, Ravena, em 2010, para ser a sede de uma empresa de segurança. Foi negociada uma entrada de R$ 20 mil e 12 parcelas de R$ 2 mil.
Quatro anos depois, em 2014, o terreno já deveria estar pago, mas, com a Justiça Trabalhista procurando bens para pagar os direitos dos ex-funcionários, houve uma reviravolta.
Oficialmente, o antigo proprietário disse que o terreno não havia sido pago e alega tê-lo retomado. Formalmente, o dono revendeu o terreno para um novo comprador: o aposentado João Bezerra… o avô de Julian.
Para o avô do deputado, o terreno oficialmente saiu por R$ 80 mil. No mesmo papel, a prefeitura diz que ele era avaliado em R$ 684 mil. No terreno, está o prédio que foi sede da Perímetro, onde Julian realizou reuniões políticas e concedeu entrevistas durante a candidatura. Os ex-funcionários esperam que o prédio possa ser vendido para que recebam o que é devido.
Até o ano que vem, o deputado eleito fará parte da equipe de transição e seguirá com poder junto ao núcleo de Bolsonaro. Ele foi visto com futuros ministros, como Sergio Moro.
Em fevereiro do ano que vem ele será o deputado Julian Lemos, oficialmente um empresário sem empresas, irmão, filho, ex-marido e marido de empresárias que hoje respondem a processos na Justiça do Trabalho.
Procurado pelo BuzzFeed News, Julian Lemos preferiu não se manifestar sobre o caso. Por meio de uma mensagem de WhatsApp, ele escreveu: “Devem estar sem notícias relevantes, ou ao menos importantes, nada que eu fale ou diga lhes interessa, vão distorcer ou omitir os fatos, na realidade eu nem sabia que vocês [BuzzFeed News] existiam até o dia em que li uma matéria capciosa, maldosa e caluniosa a meu respeito.”
A referência é ao texto logo abaixo sobre brigas no comando de campanha de Bolsonaro. Segundo o artigo 138 do Código Penal, caluniar alguém significa “imputar falsamente fato definido como crime.” Ele não explicou o considerou “calunioso” a seu respeito.
Na mensagem ao repórter, Julian prossegue: “(…) particularmente tenho desprezo por esse tipo de matérias e jornalismo que tem um único viés, destruir reputações. Portanto, Severino, me faça um favor, delete meu número da sua lista.”
Logo depois, o deputado apagou a mensagem enviada ao repórter.