A cada cinco horas, um agressor de mulheres é denunciado pelo Ministério Público do estado, na Paraíba. De acordo com os dados disponibilizados pelo Sistema de Administração da Corregedoria-Geral do MPPB, somente entre janeiro e junho deste ano, foram oferecidas 965 denúncias baseadas na ‘Lei Maria da Penha’, que nesta terça-feira (7), completa 12 anos de sua sanção.
Para a promotora de Justiça titular de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar de João Pessoa, Rosane Araújo, a Lei 11.340/06, mais conhecida como ‘Lei Maria da Penha’, representa um grande avanço na legislação brasileira e é um instrumento fundamental para o combate à violência de gênero. “A violência contra a mulher é um problema mundial, que atinge todas as classes sociais, desde a alta executiva, até a professora universitária e a mulher do campo. Isso porque a relação de gênero é uma relação de domínio, em que a mulher é vista como inferior ao homem. A ‘Lei Maria da Penha’ é um instrumento valiosíssimo porque, além de ter mecanismos para reprimir (combatendo essa violência e possibilitando processar o homem para que ele responda criminalmente pela agressão), tem, especialmente, mecanismos de prevenção para desconstruir essa cultura do machismo”, explicou.
Segundo a promotora de Justiça, essa lei “tornou visível o que era invisível”. “Se antes ninguém denunciava os casos de violência doméstica contra a mulher, a impressão que se tinha era a de que essa violência não existia. Quando surge esse importante instrumento jurídico, que prevê inclusive a criação de uma rede para proteger e cuidar dessa mulher e assegurar os seus direitos, as vítimas se sentem mais encorajadas e começam a denunciar os casos”, disse.
A promotora de Justiça que também atua na área da mulher vítima de violência, Dulcerita Alves, destacou que a ‘Lei Maria da Penha’ viabilizou a criação das Varas de Violência Doméstica, das casas-abrigo e dos centros de referência, onde a mulher tem um tratamento especializado em razão de sua condição de vulnerabilidade. “Após a criação da lei, muito se discute sobre gênero, machismo, feminismo, sororidade e outros termos que antes eram ignorados. Também foram criados os grupos reflexivos para homens (agressores). Com a ‘Lei Maria da Penha’, mais mulheres e meninas vêm sendo esclarecidas através de campanhas pelas redes sociais e, com isso, sentem-se encorajadas a denunciar seu agressor, o que faz com que vidas sejam salvas, medidas protetivas sejam concedidas e vítimas sejam esclarecidas num ambiente mais seguro, como as delegacias especializadas das mulheres. Ainda há muito a ser feito, mas a ‘Lei Maria da Penha’ é, com certeza, a baliza maior de proteção às mulheres e meninas brasileiras”, destacou.
Além de denunciar o agressor para que ele responda a processo criminal, o MPPB também atua em favor das vítimas, requerendo medidas protetivas de urgência previstas no artigo 22 da ‘Lei Maria da Penha’, como a suspensão da posse ou restrição do porte de armas; o afastamento do lar ou local de convivência com a ofendida; a proibição de determinadas condutas (a aproximação da agredida, de seus familiares e das testemunhas e o contato com ela, familiares dela ou testemunhas, por exemplo); a restrição ou suspensão de visitas aos filhos, depois de ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar e a prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
Conforme estabelece o artigo 24-A da Lei 11.340/06 (que foi alterado pela Lei 13.641/2018), o descumprimento dessas medidas protetivas de urgência configura crime.
12 anos
Sancionada em 7 de agosto de 2006 e em vigor desde 22 de setembro do mesmo ano, a Lei 11.304/06 recebeu o nome de ‘Lei Maria da Penha’, em homenagem à farmacêutica bioquímica Maria da Penha Maia Fernandes, vítima de violência doméstica por 23 anos, tendo sofrido duas tentativas de homicídio por parte do marido (uma com um tiro que a deixou tetraplégica e outra por eletrocussão e afogamento). A denúncia contra o agressor ocorreu após a segunda tentativa de assassinato. O ex-marido de Maria da Penha foi punido após 19 anos à pena de dois anos de prisão em regime fechado.
A ‘Lei Maria da Penha’ é reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das melhores legislações do mundo no enfrentamento à violência contra as mulheres. Ela modificou o Código Penal brasileiro e possibilitou que agressores de mulheres no âmbito doméstico e familiar sejam presos em flagrante ou tenham prisão preventiva decretada. Com isso, os agressores não podem mais ser punidos com penas alternativas, como o pagamento de cestas básicas, por exemplo, como ocorria antes.
A lei também aumentou o tempo máximo de detenção de um para três anos e estabeleceu medidas protetivas em favor da vítima.
Segundo dados de 2015 do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a ‘Lei Maria da Penha’ contribuiu para uma diminuição de cerca de 10% na taxa de homicídios contra mulheres praticados dentro das residências das vítimas.
A aplicação dessa lei garante o mesmo atendimento a mulheres que estejam em relacionamento com outras mulheres. Além disso, o Tribunal de Justiça de São Paulo garantiu a aplicação da lei a transexuais que se identificam como mulheres em sua identidade de gênero.