O Estado da Paraíba está obrigado a efetuar os depósitos mensais no ano de 2018 nos valores de R$ 11,3 milhões, com acréscimos semestrais de 0,25%, entre janeiro de 2019, até julho de 2020, incidente sobre a Receita Corrente Líquida do Estado a cada ano subsequente de 2019 a 2020, para garantir a quitação da dívida pública, referente aos precatórios. A decisão ocorreu na semana, durante sessão plenária do Tribunal de Justiça da Paraíba, com a relatoria do desembargador Oswaldo Trigueiro do Valle Filho.
Por unanimidade, o TJPB concedeu parcialmente a segurança nos autos do Mandado de Segurança (MS) nº 0801228-27.2016.8.15.0000 impetrado pelo Governo do Estado contra ato supostamente ilegal e abusivo praticado pelo presidente do TJPB. O ato havia determinado o valor mensal de depósito, na ordem de R$ 32,8 milhões, correspondente a um percentual mínimo de 5,21895% aplicado sobre um doze avos da Receita Corrente Líquida divulgada no quadrimestre de 2015, sob pena de sequestro, nos termos do artigo 97, § 10, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), informa publicação do TJPB.
No MS com pedido de liminar, o Estado da Paraíba relatou que o TJPB expediu ofício, em 28 de janeiro de 2016, notificando o governador a realizar mensalmente a transferência. Nos fundamentos, disse que o Supremo Tribunal Federal (STF) teria modulado os efeitos da declaração de inconstitucionalidade do artigo 97 do ADCT, mantendo-se a vinculação dos percentuais mínimos da Receita Corrente Líquida para a quitação da dívida pública; bem como que o próprio Judiciário estadual teria editado a Resolução 001/2016, aplicável a todos os processos administrativos de entes públicos inseridos no regime especial de precatórios.
O Estado da Paraíba afirmou, ainda, que vem regularizando o pagamento de seu estoque de precatórios e esclareceu que, por meio do Decreto Estadual nº 35.701/2015, fez migração para o regime disposto no §2º do artigo 97 do ADCT, que trata do regime de pagamento baseado no percentual de 1,5% da receita corrente líquida, percentual este que não foi observado pela autoridade coatora.
Entre outros argumentos, o ente estatal disse que a medida gera perigo de grave lesão à ordem e à economia pública, uma vez que o sequestro mensal da importância de R$ 32.877,471,60 ocasionará a descontinuidade de serviços públicos essenciais.
Pugnou, em caráter liminar, que a autoridade coatora se abstivesse de determinar o sequestro da importância mensal e sucessiva no valor imposto, bem como que fossem observados os termos do Decreto Lei nº 35.701/2015, que prevê o pagamento baseado no percentual de 1,5% da Receita Corrente Líquida, até que sobreviesse nova definição constitucional de regime de pagamento de precatórios. À época do ingresso do Mandado de Segurança, o pedido liminar foi deferido.
A Presidência do Tribunal de Justiça manifestou-se pela ausência de direito líquido e certo do Estado da Paraíba, esclarecendo que o Judiciário estadual estava no estrito cumprimento de Ordem Judicial do STF e de decisão plenária administrativa do próprio Tribunal. Alegou, ainda, que a fumaça do bom direito estava a favor dos credores que, por anos, viviam no aguardo do recebimento dos seus créditos legais. Argumentou que o atraso no pagamento das parcelas por parte do Estado da Paraíba fazia crescer o débito e causava mais apreensão aos credores, o que caracterizava o perigo da demora.
As partes foram intimadas para se manifestar sobre a Emenda Constitucional (EC) nº 99/2017, que instituiu o novo regime especial de pagamento de precatórios. A Presidência do TJPB alegou a perda superveniente do objeto da ação mandamental, em face das ECs nºs 94/2016 e 99/2017. Defendeu que o Estado da Paraíba questionou a quantia devida apurada nos moldes da Resolução da Egrégia Corte anterior ao novo texto constitucional e pediu a extinção do processo sem resolução do mérito.
Por sua vez, o Estado da Paraíba afirmou que a EC nº 99/2017 não acarretou a perda superveniente do objeto, uma vez que a edição da emenda foi motivada pela queda de arrecadação dos Estados e Municípios, e requereu a concessão da Segurança.
A Ordem dos Advogados do Brasil requereu o ingresso no processo como amicus curiae (amigo da corte, ou seja, instituição capaz de fornecer subsídios às decisões dos tribunais, oferecendo-lhes melhor base para questões relevantes e de grande impacto).
VOTO- Inicialmente, o relator do MS, desembargador Oswaldo Trigueiro, analisou e rejeitou duas questões de ordem. A primeira, que dizia respeito ao pedido formulado pela OAB/PB, o magistrado afirmou não haver em que se falar no ingresso da entidade na qualidade de amicus curiae, uma vez que a demanda não tratava de conhecimento técnico específico de natureza extraordinária. Entendeu que o interesse da OAB estava atrelado a “um nítido interesse corporativo, visando atingir êxito na demanda em favor do impetrado para, com isso, obter proveito econômico em favor da corporação em si”.
Em relação à segunda questão de ordem, na qual o Estado da Paraíba pedia a suspensão do julgamento do Mandado de Segurança até que o STF modulasse, em definitivo, a questão tratada no feito, o desembargador-relator rejeitou o pleito, afirmando já existir modulação de efeitos a ser cumprida, instituída pela EC nº 62/2009, que determinou a forma de pagamento de precatórios por cinco exercícios financeiros, a contar de primeiro de janeiro de 2016, prolongando-se até o ano de 2020.
Quanto a preliminar da perda superveniente do objeto do Mandado de Segurança, arguida pela Presidência do Tribunal de Justiça, o relator rejeitou, alegando não se tratar de impugnação específica a um ato coator restrito a observância de determinada Resolução, mas ao inconformismo da conduta da autoridade coatora.
MÉRITO – Ao analisar o mérito, o desembargador Oswaldo Trigueiro Filho observou que o Estado a Paraíba, no primeiro momento, optou pelo regime de pagamento de precatório em 15 anos, de acordo com o inciso II do §1º do artigo 97 do ADCT. Posteriormente, migrou para o regime previsto no inciso I do §1º, artigo 97 do ADCT, que prevê o depósito mensal do percentual de 1,5% sobre o total da Receita Corrente Líquida. O relator indaga, em seu voto, o porquê da obrigação do Estado ter sido majorada de 1,5% para 5,21895% da Receita Corrente Líquida mensal.
Ele enfatizou que quando o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos da ADI, dando ao regime especial de pagamento de precatório uma sobrevida de cinco anos, concedeu, em verdade, referido prazo para os entes federados pagarem suas dívidas, a fim de que, a partir de 1º de junho de 2019, estivessem prontos para dar cumprimento ao disposto nos §§ 5º e 6º do artigo 100 da Constituição Federal, que obriga os estados a incluírem nos seus orçamentos verba necessária para o pagamento de precatório e que as dotações orçamentárias e os créditos sejam consignados diretamente ao Poder Judiciário.
O desembargador Oswaldo Trigueiro afirmou que a conduta da administração estadual e o pleito na ação mandamental incidem em manifesta inconstitucionalidade e que a concessão da segurança na forma requerida representa um intento de modificar a própria modulação dos efeitos realizada pelo STF e, ainda, o próprio texto constitucional.
“A par da real situação financeira do Estado, e diante da legítima expectativa de milhares de credores em perceber seus créditos, fere o bom senso e a razão, indultar o Estado da Paraíba de suas obrigações, principalmente quando se nota o seu desdém e sua desídia em cumprir ao menos com o percentual de 1,5%, fixado em sede de liminar”, ressaltou o relator, ao conceder parcialmente a segurança e tornar sem efeito a liminar.