Alessandra de Paula
A greve é um instrumento utilizado pelos trabalhadores, de qualquer setor de produção, para exercer pressão, seja sobre os patrões, seja sobre órgãos da administração pública, de forma direta ou indireta.
Fenômeno social de grande importância – considerados os motivos que a materializam e a participação dos grupos que reivindicam o que consideram seus direitos –, a greve ocorre entre os trabalhadores que compõem a camada caracterizada como pertencente à infraestrutura social. No entanto, outros campos do conhecimento também se ocupam de análises em relação à prática desse movimento reivindicatório com pretensões de compreender e, também, reverter prejuízos causados por paralisações de determinado setor.
Assim, reflexões e discussões são realizadas, profissionais se debruçam sobre números e estatísticas, para poderem divulgar os impactos das greves principalmente sobre a economia de uma região ou de um país.
Essa movimentação toda foi verificada, recentemente, quando uma greve organizada por caminhoneiros, com a duração de 11 dias, deixou visíveis alguns pontos de vulnerabilidade de nossa economia, principalmente expondo a dependência do setor produtivo em relação ao transporte rodoviário.
Durante o período de paralisação, as estradas foram bloqueadas, o que acarretou desabastecimento de vários produtos, principalmente os perecíveis, como carnes, frutas, verduras, leite e seus derivados. A falta de combustíveis nos postos de gasolina e em aeroportos também foi um agravante, pois provocou o cancelamento de voos nacionais e internacionais e causou danos em setores de produção de bens e serviços, assim como trouxe prejuízos aos consumidores, de maneira geral, com a consequente elevação dos preços de diversos produtos e reflexos no transporte público. Perdas também foram observadas nos segmentos da saúde, pois hospitais ficaram desabastecidos de materiais e medicamentos para, inclusive, atendimentos de urgência e emergência, e da educação, com o cancelamento ou precarização de aulas, pois os alunos, muitas vezes, não conseguiram chegar aos estabelecimentos de ensino.
Em resumo, o impacto social e econômico resultante do movimento grevista tomou grandes proporções, a ponto de alguns analistas econômicos se mostrarem bastante preocupados com seus desdobramentos, em médio e longo prazo.
Dentre as principais reivindicações dos caminhoneiros, pode-se destacar a política de controle do preço do diesel, a extinção da cobrança de pedágio referente aos eixos suspensos e a aprovação do projeto de lei 528/2015, que define um valor mínimo pago por frete, o que propiciaria maiores garantias de lucro aos motoristas.
Com o objetivo de atender a algumas das solicitações, o governo anunciou uma redução de R$ 0,46 no litro do diesel com um congelamento de preço por 60 dias sendo que, transcorrido esse prazo, os reajustes voltariam a ser mensais, e não diários ou semanais, como estavam sendo praticados. Foram anunciadas, também, outras medidas provisórias. Uma delas aponta para a isenção de cobrança de taxa de pedágio do eixo suspenso; uma segunda estabelece o direito dos caminhoneiros autônomos a 30% do frete da CONAB; e uma terceira que determina uma tabela mínima para a cobrança/pagamento do frete. Estima-se que essas medidas possam trazer, à economia do país, um impacto da ordem de R$ 10 bilhões, valor expressivo se considerada a economia já instável por causa de outros fatores, principalmente eventos climáticos e valores praticados no mercado externo.
Ainda existem outras medidas em tramitação, como o programa de incentivo à renovação de frota, com a concessão de alíquota zero de PIS/Pasep, Cofins e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a compra de caminhão por motoristas autônomos e também por pequenas transportadoras, com a obrigatoriedade de entrega do veículo antigo, para que seja encaminhado para reciclagem. Outra medida é a anistia de multas emitidas pela Agência Nacional dos Transportes (ANTT) para infrações de caráter médio e leve, sem reincidência no período de 12 meses, que poderão ser substituídas por advertência. Outra mudança é no limite de 20 pontos para cassação da carteira que passa a ser de 40 pontos para os caminhoneiros. Contudo, isso só é possível desde que não exista multa grave ou gravíssima.
No entanto, para implementação dessas medidas, há outros fatores a serem considerados, principalmente se forem levadas em conta as péssimas condições das rodovias brasileiras, principais canais de escoamento da produção agropecuária e de hortifrutigranjeiros. A revitalização da malha viária implicaria mais investimentos dos que os previstos, ainda mais se forem computadas as alterações do cenário econômico do Brasil, uma vez que, de acordo com o Banco Central, a projeção de crescimento, que era de 2,37%, caiu para 2,18%. Com a alta dos preços no período da greve, a estimativa para o índice de preços ao consumidor (IPCA), índice oficial de inflação, passou de 3,6% para 3,65%. Esse percentual está abaixo do centro de meta de inflação que é de 4,5% – mas, para 2019, a projeção do IPCA feita por economistas é de 4,01%.
O cenário que se apresenta merece, portanto, um olhar mais atento do setor de logística, principalmente com o planejamento e implementação de ações efetivas para minimizar o impacto dessas perdas junto aos produtores e consumidores, de maneira geral. Nesse primeiro momento, as ações poderiam estar voltadas à retomada de crescimento do país, por meio da intralogística, com melhorias em diversos setores de cada empresa, como tecnologias da informação, condomínios empresariais, segurança e gestão de risco, buscando soluções multimodais, agregando toda a cadeia logística em função do aperfeiçoamento de custos e efetivação de processos para minimização de custos.
Investimentos em sistemas de transporte, bi ou plurimodais, podem ser a resposta, em médio ou longo prazo, para a retomada do crescimento econômico.
O país tem uma malha ferroviária subutilizada, assim como hidrovias, situação que se reflete nas rodovias, que carecem de manutenção e recuperação. Um bom planejamento de estratégia logística, voltado ao melhor aproveitamento dos recursos oriundos de uma parceria público-privada poderia ser a resposta para a retomada do crescimento econômico do país, assim como para a manutenção dos direitos conquistados pelos caminhoneiros, no movimento recentemente deflagrado.
Alessandra de Paula é coordenadora do curso superior de Logística da Escola de Gestão, Comunicação e Negócios do Centro Universitário Internacional Uninter.