Murilo Gabriel é uma criança de 11 anos, filho de Olivânia Ferreira da Silva, de 34. Menino muito bonito, educado e gentil, tem cabelos claros, rosto afilado, nariz mediano e olhos castanhos que revelam um brilho diferente, de quem cultiva sonhos profundos a serem impulsionados pela Educação Integral.
Murilo é aluno da Escola Municipal Ativa Integral (EMAI) Arnaldo de Barros Moreira, no Bairro dos Novais, e só conhece o passado de João Pessoa através dos livros. A lição do presente, no entanto, ele sabe de cór e aguarda ansioso para desbravar os mares do futuro. Ah, o futuro! É quando fala nele que os olhos do menino mais se acendem, se tornam quase como o sol revelando a imagem do seu sonho.
Nas mãos, ainda pequeninas, uma bola de handebol que mais parece a extensão de seu corpo responde a pergunta sobre o que ele pretende ser quando crescer. “Quero ser um esportista. Um grande campeão!”.
O questionamento continua pela curiosidade de saber o porquê da escolha. E a resposta sai com a naturalidade de quem está sendo sustentado por um projeto pedagógico de linhas retas e escrita firme. “Eu jogo handebol e minha equipe ganhou uma competição no Rio Grande do Norte. Participo aqui das aulas Eletivas, e os professores me incentivam muito e, por isso, sonho em seguir no esporte”, disse em tom de gratidão.
A mãe de Murilo, Olivânia Ferreira, foi aluna da mesma unidade em uma época em que ainda não existia escola em tempo integral. Emocionada, expõe toda a sua alegria em ver o filho ter as oportunidades que ela não teve quando criança. “Quando eu era estudante dessa escola, tudo era muito difícil. Agora, meu filho está no mesmo local, em uma época diferente, e pode ter as oportunidades que eu não tive. Com certeza, seu futuro será bem melhor. Ele pode sonhar mais alto e alcançar esse sonho”, desabafa.
Um mergulho no passado para viver o futuro – Agora vamos mergulhar no mundo de uma garota de 16 anos de idade, aluna do 9º ano. Bianca Santos é tão sonhadora quanto Murilo e alimenta a certeza de que será uma bela advogada. De sorriso fácil e desenvoltura no falar, a jovem deixa estampado na fisionomia o poder de uma vencedora que não abre mão da sala de aula, por saber que é neste lugar onde os primeiros passos para a concretização do seu desejo estão sendo dados.
Nas aulas Eletivas ela é eclética, dança e representa muito bem nas peças teatrais apresentadas. Um treino para saber se portar diante dos júris a serem enfrentados no futuro firmado no conhecimento sobre o passado. “Na Eletiva eu participo do projeto que tem o nome ‘Minha Terra Ancestral’, fala sobre os nossos ancestrais, os povos africanos, os povos indígenas. Todos nós devemos saber da nossa ancestralidade”, argumenta a garota cheia da certeza da importância dos povos diversos, acrescentando que tudo isso só é possível por meio de uma Educação inclusiva.
“A educação muda tudo. Sem educação a gente não vai pra frente, a gente não sabe mais. E é preciso, nós sabermos mais e muito mais sobre a nossa ancestralidade, e sobre tudo que envolve o respeito a todos”, fala com clareza Bianca.
Eletivas, o que são elas – O professor, pedagogo e filósofo Paulo Freire, considerado patrono da Educação brasileira, dizia que “ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”. É mais ou menos assim que acontece na prática das Eletivas – citada por nossos personagens. Um método aplicado nas Escolas Municipais Ativas Integrais (EMAIs) de João Pessoa.
Nas Eletivas, os alunos se empoderam, compreendem a importância do seu papel na escola, se unem aos educadores e a colegas de outras turmas, até de outras séries. Com todos juntos, fica mais fácil assimilar a essência da Educação: a formação de um cidadão de bem que entende o respeito ao próximo, as suas crenças, ideias, escolhas e a tudo aquilo que a sociedade chama de diferente.
“As Eletivas são disciplinas temáticas, oferecidas semestralmente, propostas pelos professores, levando em consideração as necessidades de aprendizagem e os sonhos dos estudantes e objetivando possibilitar à criança e/ou adolescente a construção de parte do seu próprio currículo por meio da ampliação e diversificação de conceitos, conteúdos ou temas trabalhados nas disciplinas do currículo comum. São uma oportunidade para a ampliação do seu conhecimento de uma forma mais lúdica e interessante, a fim de que o estudante possa interagir de forma direta nesse processo de aprendizagem”, esclarece o coordenador das Escolas Integrais da Secretaria de Educação e Cultura (Sedec), Clécio Albuquerque.
A aula Eletiva é o que tem impulsionado o aluno a sonhar alto, é um dos dispositivos responsáveis por mover a conexão resultante de uma nova metodologia pedagógica implantada nas Escolas Municipais Ativas Integrais de João Pessoa, onde existe um ensino orientado voltado para o trabalho das dificuldades dos alunos, oportunizando a eles técnicas de aprendizado para sanar suas dificuldades e esclarecer as dúvidas.
“Neste modelo das EMAIs, essa diversidade é muito presente no currículo diversificado, no projeto de vida, no protagonismo, no pensamento científico, nas Eletivas, também no estudo orientado. Os alunos se juntam nos seus clubes e desenvolvem o seu protagonismo, eles pensam o seu projeto de vida. São grupos articulados, sistematizados, direcionados inicialmente”, detalha a coordenadora pedagógica da EMAI Arnaldo de Barros Moreira, Simone Ferraz Pereira.
Na semana passada, algumas das EMAIs realizaram a culminância das Eletivas, reunindo alunos, pais e educadores em um momento de muita interação e inclusão. A coordenadora pedagógica da EMAI Radegundis Feitosa, no bairro José Américo, Ísis Oliveira, explicou como é esse momento do cronograma.
“A culminância das Eletivas é um evento que marca o encerramento de parte de um ciclo de aprendizagem dos estudantes, sendo uma oportunidade de apresentar os resultados alcançados. É um momento de celebração, onde todos os estudantes têm a chance de compartilhar suas experiências, aprendizados e conquistas com seus familiares”, falou.
De acordo com a gestora da escola, Lavínia Guedes, esse momento é muito importante para toda equipe, pois é uma oportunidade de conversar com as famílias e também de ver a satisfação delas em relação à participação dos filhos nas disciplinas Eletivas. “Aproxima muito a gente das famílias, pois, além da satisfação de verem seus filhos apresentando suas produções, as famílias encontram sentido nas atividades desenvolvidas pelos estudantes, na medida em que reconhecem-os enquanto verdadeiros protagonistas”, destacou.
Novo modelo de escola – No ano de 2023, foram criadas 10 EMAIs, em João Pessoa. A escolha por uma nova proposta curricular para as escolas integrais se fundamenta na compreensão de educação em tempo integral como aquela que garante o desenvolvimento dos educandos em todas as dimensões, formação intelectual, psíquica, social e cultural a partir de um projeto curricular que tem como centralidade o estudante e seu projeto de vida.
Nesse sentido, a intencionalidade do projeto educativo das EMAIs se volta para assegurar os conhecimentos científicos, tecnológicos e éticos, além de habilidades e competências requeridas pela sociedade do século XXI. O gestor da EMAI Arnaldo de Barros Moreira, Humberto Nóbrega, pontua alguns detalhes desse caminho.
“A gente trabalha muito com a questão socioemocional, as novas tecnologias e, especialmente, que esse aluno consiga vislumbrar o trabalho, não pelo trabalho, mas o trabalho de acordo com valores estabelecidos pela ética. Porque, esse aluno aqui trabalhando na perspectiva do protagonismo tem que ter uma visão de ser solidário, de ser autônomo e de ter criatividade. E as possibilidades que essas novas metodologias oferecem é esse caminho diferenciado”, salientou.
Educar, formar bons cidadãos, realizar sonhos. Essa tríade fala sobre o futuro de uma nação inteira. Contudo, para garantir uma construção sólida, que não se desmanche na primeira ventania, há desafios a serem vencidos. “Não é um caminho fácil, porque a gente vive em comunidades muito difíceis, a realidade é essa. Se você for pegar que a maioria das escolas municipais é em comunidades muito difíceis, a gente tem uma cultura muito grande de violência, de indisciplina, é um trabalho diário que a gente faz”, contou Humberto Nóbrega.
Barreiras que, segundo o gestor da EMAI, só serão ultrapassadas com a valorização da Educação. “A escola basicamente é uma casa para esses meninos, a escola integral, para muitos deles, é até um suporte alimentar. E, além de tudo isso, esses alunos estão num ambiente seguro, que é o que os pais querem, pais que quando escolhem uma escola integral, principalmente, são pais trabalhadores, que saem de manhã, logo cedo, seis horas da manhã, para trabalhar e chegam aqui na escola de cinco da tarde para pegar o filho para levar para casa. É essa a realidade que a gente tem aqui e que será sempre superada pela Educação”, finalizou.
É como diria Paulo Freire: “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”.
E João Pessoa, que completa 439 anos de fundação, acredita na transformação das pessoas e, consequentemente, do mundo. Por isso, investe na Educação com ousadia, para ver a construção de um futuro não apenas promissor, mas concretizado.