O Ministério Público da Paraíba atuou em 7.810 processos judiciais e extrajudiciais relacionados a crianças e adolescentes, no último ano. A atuação tem como objetivo garantir o cumprimento dos direitos e deveres previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que, neste sábado (13/07), completará 34 anos de existência.
Os dados disponíveis no ‘Mapa de Atuação Finalística do MPPB’ revelam que as promotorias de Justiça com maior número de processos são João Pessoa (23,8%), Campina Grande (13,4%), Patos (4,2%), Guarabira (3,7%) e Pombal (2,8%) e que os assuntos mais demandados são medidas protetivas, abuso sexual, maus-tratos e acolhimento institucional de crianças e adolescentes.
A promotora de Justiça de João Pessoa, Soraya Nóbrega, que atua na defesa da criança e do adolescente há 21 anos, destacou a importância do ECA. “O dia 13 de julho, desde 1990, sempre será um marco histórico na proteção dos direitos das crianças e adolescentes. E ao completar 34 anos, o ECA continua sendo símbolo de compromisso para com a efetivação dos direitos previstos na legislação, sobretudo com os princípios da proteção integral e prioridade absoluta”, explicou.
Avanços e desafios
Ela destacou os avanços trazidos pelo dispositivo legal. “Um dos grandes avanços da Lei Federal 8.069/1990, que inclusive é referência para outros países, é o fato de ter passado a reconhecer, oficialmente, crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, pessoas em desenvolvimento e prioridade absoluta, por meio de um Sistema de Garantia de Direitos. O ECA, na verdade, foi a primeira legislação baseada na proteção integral”, disse.
A representante do MPPB lembrou que várias leis sobrevieram para fortalecer o sistema de proteção inaugurado pelo ECA, a exemplo da Lei Henry Borel, que criou, recentemente, mecanismos de prevenção e enfrentamento da violência doméstica contra crianças e adolescentes.
Ela também falou dos desafios para a efetivação plena do Estatuto na Paraíba e no Brasil. “Temos ainda grandes desafios pela frente. Um deles é o orçamento público, tornar a criança e o adolescente prioridade no orçamento, através do investimento na prevenção. Tudo quando se fala nesse público é difícil porque é um público que não vota. Mesmo assim seguimos incansáveis na luta por seus direitos. Outro grande desafio é a oferta de ensino público fundamental e médio em período integral, com atividades lúdicas, de lazer e esporte no contraturno escolar. A regularização dos fundos para Infância e Adolescência (FIAs) para recebimento de recursos é também um desafio, além da proteção dos direitos de crianças e adolescentes no ambiente digital, diante da velocidade dos avanços tecnológicos e apesar das leis já em vigor no Brasil”, elencou.
Prevenção
Para a promotora de Justiça, a falta e/ou deficiência de políticas públicas preventivas colabora para a violação da lei. “Se houver investimento em prevenção, o poder público gastará menos com repressão. Mas essa regra é invertida. E isso impede mais avanços. Sabemos que ao deixar de investir em programas e projetos sociais nos bairros e em educação de qualidade, o caminho fica livre para o crime organizado. E não podemos, nem devemos cruzar os braços e perder essa guerra, permitindo que ocupem cada vez mais espaços. É muito triste quando nas audiências constatamos que as facções estão no comando e se instalando nos bairros, conquistando a população e dominando nossas crianças e adolescentes”, lamentou.
Para a representante do MPPB, a efetivação de direitos de crianças e adolescentes é dever de todos. “Faço um pedido de reflexão para cada um, seja família, sociedade ou Estado, de modo geral, no sentido de se questionarem se, realmente, têm trabalhado efetivamente em prol da criança e do adolescente, tratando-os como prioridade absoluta na condição de pais, de cidadãos e de autoridades. Será que conseguimos – enquanto pais, mães, profissionais, sociedade em geral e poder público – proteger efetivamente nossas crianças e adolescentes, garantindo-lhes os direitos fundamentais, pondo-os a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão? Estamos devendo muito ainda… E é porque não cruzamos os braços e somos incansáveis, não desistimos da causa. Insistimos e persistimos. E graças a essa insistência muito também já fizemos ao longo desses 34 anos de existência do ECA. E devemos nos orgulhar. Até porque durante todo esse período muitas ações foram ajuizadas, muitas conquistas foram realizadas na prática e inúmeras crianças e adolescentes foram salvos por meio de nossas ações, sejam judiciais, sejam extrajudiciais. Sonho que chegue o dia em que crianças e adolescentes sejam realmente prioridade no orçamento público. E que os deveres da família, da sociedade e do Estado, previstos no ECA, sejam cumpridos efetivamente”, disse.
Confira os principais avanços do ECA apontados pela promotora de Justiça:
1 – Reconhecimento de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e não mais apenas como objetos de proteção e seres sem voz;
2 – Disque 100 (Disque Denúncia Nacional) e disque-denúncias estaduais e municipais;
3 – Lei 13.010/2014 / Lei “Menino Bernardo” (conhecida como “Lei da Palmada”);
4 – Marco legal da primeira infância (Lei 13.257/2016);
5 – A perda do poder familiar com a Lei 13.715/2018;
6 – A Lei da Escuta Especializada (Lei 13.431/2017);
7 – A Lei Henry Borel (Lei 14.344/2022).