Ainda sob muitos questionamentos ao texto do relator Vicente Cândido (PT-SP), o plenário da Câmara conseguiu aprovar, no fim da tarde desta quarta-feira (4), o texto-base com as regras para o fundo público de financiamento de campanhas a ser criado. Já por volta das 21h30, os deputados aprovaram o texto-base da criação do fundo, por meio de um requerimento para que essa votação não fosse nominal, ou seja, não identificasse como cada deputado votou. Mas, depois de protestos que quase descambaram para a briga física em plenário (leia e veja o vídeo abaixo), a votação foi levada a revisão devido à revolta generalizada. Ao final, o voto nominalmente registrado foi a regra que prevaleceu. Superada a confusão, a Casa vai enviar à sanção do presidente Michel Temer um fundão público eleitoral de R$ 1,7 bilhão, em um cenário de rejeição popular tanto ao peemedebista quanto ao modelo de financiamento, segundo o Congresso em Foco.
Concebido como uma alternativa à proibição, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do financiamento empresarial de campanhas, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) será composto por 30% das chamadas emendas impositivas (repasse obrigatório de recursos orçamentários a parlamentares) reservadas às bancadas de deputados e senadores. Também abastecerá o fundo a compensação fiscal que o governo paga a emissoras de rádio e televisão pela exibição de propaganda partidária, que a matéria em questão (Projeto de Lei 8703/17) extingue.
A maioria favorável à criação do fundo se impôs e derruba, um a um, destaques apresentados para modificar o PL 8703/17, que foi concebido no Senado. O primeiro deles, de autoria do PHS, tinha como objetivo justamente excluir da matéria o artigo que formaliza a criação do fundo. Em meio a divergências não superadas, houve a obtenção de um compromisso, entre partidos e o governo, no sentido de que alguns trechos do projeto sejam vetados – por exemplo, critérios de repartição de recursos eleitorais entre as legendas. Tais elementos estão regulamentados no Projeto de Lei 8612/17, cujo texto-base já foi aprovado hoje.
A matéria em questão regulamenta o FEFC para bancar as campanhas eleitorais com dinheiro público. Mas esse PL apenas cria a regulamentação do fundo aprovado, e precisa ser complementado com a definição das fontes de custeio e os valores. A questão foi resolvida com o texto proveniente do Senado (PL 8703/17), com o montante previsto em cerca de R$ 1,7 bilhão para as próximas eleições.
Apesar de o texto do relator do PL 8612/17, Vicente Cândido (PT-SP), ter sido extensivamente debatido, os deputados tiveram de inverter a pauta no início da noite para dar consecução aos trabalhos, após a votação de três destaques apresentados por partidos. Na condução da sessão deliberativa, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pediu que a proposição fosse rapidamente votada em plenário, mas também reclamou das alterações que a matéria sofreu no transcurso dos debates. Além das divergências, o próprio conjunto de normas da Casa retardou o trâmite dos projetos.
“Combinamos votar um texto enxuto. Agora, aparece um texto com mais 17 páginas [em relação ao que foi apresentado na segunda-feira, 2/out]. Como alguém aqui vai saber o que está votando?”, questionou Maia.
Após os deputados aprovarem as regras de distribuição do fundo – o terceiro dos 21 destaques apresentados até aquele momento –, a sessão foi encerrada para dar vez a outra, como impõe o Regimento Interno da Câmara. Ato contínuo, Maia iniciou uma nova sessão para então votar o fundo proposto pelo Senado, aprovado na semana passada, na última terça-feira (26), em procedimento polêmico que também recorreu à votação simbólica.
Divergência
Entre os críticos do fundo público está o deputado Chico Alencar (Psol-RJ), para quem o valor está muito elevado. Chico disse entender que a matéria não visa alterar o modelo de financiamento das campanhas, mas bancar com recursos públicos o mesmo sistema. “A gente quer denunciar aqui este ‘fundão’ por impróprio, criado por quem sempre viveu de dinheiro de empreiteira e de grandes financiadores. Defendemos o Fundo Partidário já existente, que pode ser ampliado em época de campanha, mas de maneira austera”, reclamou o parlamentar fluminense.
“Estamos acostumados a fazer campanha com muito dinheiro, mas dá para fazer campanha gastando sola de sapato, fazendo discurso e visitando as pessoas. Precisamos de novas formas que não um fundo que, eventualmente, vai tirar dinheiro necessário em outros lugares”, emendou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), também contrário ao fundo.
Vaiado ao defender o fundo na tribuna, Celso Pansera (PMDB-RJ) defendeu a aplicação da fonte de custeio e explicou que, por não ter o dinheiro que desejava para bancar sua campanha, precisa de recursos do eleitor contribuinte para voltar à Câmara em 2019. “Existe um custo financeiro para se ter um país democrático, para dar às pessoas a possibilidade de votar em todos aqueles que quiserem ser candidatos”, ponderou o peemedebista.
Outro defensor do fundo de financiamento, Henrique Fontana (PT-RS) explicou por que apoia sua aprovação. “É um valor moderado para garantir uma eleição efetivamente democrática”, disse o petista em plenário.
“Seu merda! Seu merda!”
A tentativa de votação simbólica produziu em empurrões e gritaria em plenário. Júlio Delgado se exaltou e gritava com deputados do PMDB, defensores do fundo bilionário, principalmente com Hildo Rocha (PMDB-MA). Mas foi com Carlos Marun (PMDB-MS), líder da tropa de choque do presidente Michel Temer na Câmara, que a situação quase saiu de controle.
Marun tentou acalmar Delgado, que continuou a gritar e avançar de dedo em riste e punhos cerrados em direção aos adversários. Foi aí que os dois se desentenderam e trocaram gritos, empurrões e ofensas. “Seu merda! Seu merda!”, vociferou Marun, enquanto colegas tentavam afastá-lo do colega da oposição.