O bate-boca entre o senador eleito Hamilton Mourão (Republicanos-RS) e os filhos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) marcou uma nova etapa na disputa pela liderança do eleitorado que se opôs à eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No mesmo dia em que Mourão se pronunciava em rede nacional, os generais da reserva Paulo Chagas e Carlos Alberto dos Santos Cruz também voltaram criticar Bolsonaro.
Em jogo, está a disputa pela liderança política de parte da direita que votou em Bolsonaro para presidente. Ao Estadão, veículo que originalmente publicou esta matéria, Santos Cruz, que foi ministro-chefe da Secretaria de Governo de Bolsonaro, afirmou que uma das principais tarefas dos que desejam organizar a oposição democrática de direita ao novo governo é esclarecer as pessoas que se deixaram iludir por Bolsonaro.
“É preciso se livrar de Bolsonaro e do bolsonarismo. O ex-presidente não tem condições de ser líder da direita. Ele não é de direita. É um extremista populista que só prejudicou e acarretou desgastes à direita. É um dos destruidores da direita e transferiu sua responsabilidade política para os militares”, declarou.
Filiado ao Podemos, Santos Cruz pôs seu nome à disposição do partido para a disputa à Presidência da República em 2022. Para ele, a direita terá de “se recompor com liderança de qualidade, e não com um fanfarrão”. “A liderança da direita precisa ser capaz de atrair o centro, se livrar do extremismo populista-bolsonarista.” O fato detonador das novas críticas foi a viagem de Bolsonaro aos Estados Unidos antes do término do mandato.
“Existem grupos na frente dos quartéis que foram desconsiderados e desrespeitados pelo presidente, pois, em maior ou menor grau, são seus seguidores”, escreveu Santos Cruz no sábado passado. Seu texto foi publicado por Chagas, expoente da direita militar no Distrito Federal. “O que se viu e se vê é a desonestidade, a falta de sinceridade do presidente sobre a realidade nacional para aqueles manifestantes”, continuou Santos Cruz.
Na manhã desta segunda-feira, 2, os manifestantes que permaneciam em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília, deixaram o acampamento. O desânimo levou os bolsonaristas a culpar os generais da ativa por terem permitido a posse de Lula em vez de darem um golpe.
Chagas foi um dos que se juntaram ao coro das críticas aos colegas que garantiram a posse do presidente eleito. “Tenho testemunhado muitas críticas negativas de militares da reserva aos militares da ativa, principalmente aos generais. Sinto pena deles e vergonha de nós, porque, se as gerações que nos sucedem não forem melhores do que a nossa, é porque a nossa foi incompetente!”, escreveu Chagas no Twitter.
O que está por trás das manifestações dos militares da reserva é a disputa do eleitorado bolsonarista, em grande parte formado pela chamada família militar. Na esteira da eleição de Bolsonaro, o Congresso ganhou seis deputados federais militares em 2018 – apenas dois não se reelegeram em 2022. E, apesar da derrota na eleição presidencial, candidatos com origem nas Forças Armadas vão ocupar em 2023 duas cadeiras no Senado e seis na Câmara dos Deputados, além de governar o Estado de São Paulo.
Nesta segunda-feira, Chagas se manifestou para negar a disputa pelo voto bolsonarista. “Não sou caçador de seguidores, nem pregador de ilusões. Não tenho ambições políticas.” No sábado, após a viagem de Bolsonaro aos Estados Unidos, Mourão, na condição de presidente da República em exercício, disse que “lideranças que deveriam tranquilizar e unir a Nação em torno de um projeto de país deixaram com que o silêncio ou o protagonismo inoportuno e deletério criasse um clima de caos e de desagregação social e de forma irresponsável deixaram que as Forças Armadas de todos os brasileiros pagassem a conta, para alguns por inação, e para outros por fomentar um pretenso golpe”.
Logo depois do pronunciamento de Mourão, o filho do ex-presidente, vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) escreveu: “Nenhuma novidade vinda desse que sempre disse que era um Bosta!” Seu irmão, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), demonstrou sua contrariedade com o senador eleito e comparou seu comportamento com o de ministros de Bolsonaro quando deixaram seus cargos no governo.
Universo das Forças Armadas
5.840.722
é o número de militares federais e estaduais que o Brasil tinha em 2019, segundo dados da Receita Federal colhidos pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública
13,8%
deste total de 5.840.722 militares eram da ativa
57,8%
é o quanto representavam as polícias militares, sozinhas, do total dos militares da ativa
é o número de pessoas da chamada família militar – cônjuges, filhos e militares –, de acordo com cálculo feito por Renato Sérgio de Lima, presidente do fórum
8%
é o que representa a família militar e policial do eleitorado brasileiro
406.426
é o total de policiais militares na ativa
360,3 mil