Sem previsão de que o governo conseguirá os votos necessários para aprovar a reforma da Previdência, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pretende engavetar o projeto e transferir o ônus da derrota para o Palácio do Planalto.
Maia não deve agendar nova data para a apreciação da proposta caso não haja apoio de 308 dos 513 deputados para aprová-la em 20 de fevereiro, para quando está prevista a votação em plenário, revela reportagem de Marina Dias, da Folha.
Seu plano é dizer que o texto ficará como “legado” para ser votado em 2019 pelo novo presidente da República que será eleito neste ano.
O deputado se irritou com as declarações do presidente Michel Temer sobre “ter feito sua parte” para que a reforma avançasse no Congresso, e estuda fazer um discurso duro, com críticas à articulação do Planalto, caso não haja votos suficientes para aprová-la na data prevista.
A conta de Maia é a seguinte: quanto mais Temer e sua equipe tentarem transferir aos deputados a culpa por não terem dado aval ao projeto, mais agressiva deve ser sua fala quando a reforma naufragar por completo.
A aliados, o presidente da Câmara disse que isentará os parlamentares —os deputados resistem em aprovar mudanças no sistema previdenciário em ano de eleição— e enumerará os motivos pelos quais, na sua opinião, o governo não conseguiu apoio.
Ele avalia que o Planalto gastou boa parte de seu capital político no ano passado para enterrar as duas denúncias contra Michel Temer.
Maia admite que a derrota da Previdência já é prevista por políticos, empresários e investidores, mas acredita que propostas como a reoneração da folha de pagamento, a privatização da Eletrobras, entre outras, podem ser uma forma de acalmar o mercado. Com a Previdência fora da pauta, esses projetos terão um caminho mais livre para avançar no Congresso.
Temer e seus auxiliares, por sua vez, não querem reconhecer que a batalha terminou e ainda articulam para que o texto —já bastante desidratado em relação ao original— consiga o aval da Câmara este mês.
REUNIÃO
Neste domingo (4), por exemplo, Temer se reuniu no Palácio do Jaburu com o relator, Arthur Maia (PPS-BA), e os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Moreira Franco (Secretaria-Geral), para debater os pontos que ainda podem ser negociados na tentativa de vencer as resistências dos deputados indecisos.
Pedidos de alterações foram feitos, inclusive, pelo presidente da Câmara, que, apesar de estar bastante pessimista quanto à aprovação —a conta do governo hoje é de cerca de 250 votos a favor da reforma—, não quer passar a ideia de que desistiu por completo da proposta.
Nas suas articulações, Rodrigo Maia vai tentar conquistar votos diretamente com governadores e prefeitos que têm projetos a serem votados na Câmara e podem pressionar os deputados de sua base a apoiarem a medida.
Entre o que está sendo negociado está a criação de um sistema de transição para servidores públicos que ingressaram antes de 2003 e a retirada da proposta de limitação a dois salários mínimos para o acúmulo de pensão e aposentadoria.
Na reunião deste domingo, o governo ficou de fazer as contas para ver se será possível flexibilizar esses pontos.
CÁLCULO ELEITORAL
A postura que vem adotando durante o debate e a votação cada vez mais próxima da reforma da Previdência é também um cálculo eleitoral do presidente da Câmara.
Há pelo menos três meses, ganhou forma —e articulação— sua pretensão de se candidatar ao Planalto nas eleições de outubro.
Maia aparece apenas com 1% das intenções de votos na última pesquisa Datafolha e sabe que a Previdência é uma bandeira pouco popular.
Sua estratégia agora é colocar em pauta na Câmara propostas de segurança pública e saúde, com mais apelo junto à sociedade.
Auxiliares do ministro da Fazenda avaliam que Maia poderia tentar culpar Meirelles pelo fracasso da reforma.
Ambos disputam o posto de candidato da centro-direita como uma alternativa a Geraldo Alckmin (PSDB), e, inicialmente, avaliavam que obter protagonismo à frente da medida era essencial para o sucesso das candidaturas.
Maia, no entanto, diz que não pretende transferir o ônus da derrota para o ministro. O deputado acredita que, caso o Planalto decida lançar um candidato do governo, o próprio Temer poderia ser esse personagem.
Com aprovação baixíssima, o presidente nega que disputará a reeleição. Segundo o Datafolha, 87% das pessoas não votariam em alguém indicado por ele.