O governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) destinou R$ 26 milhões de recursos do MEC (Ministério da Educação) para a compra de kits de robótica para escolas de pequenas cidades de Alagoas que sofrem com uma série de deficiências de infraestrutura básica, como falta de salas de aula, de computadores, de internet e até de água encanada.
De acordo com a matéria originalmente publicada pela Folha, todos os municípios têm contratos com uma mesma empresa de aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), responsável por controlar em Brasília a distribuição de parte das bilionárias emendas de relator do Orçamento, fonte dos recursos dos kits de robótica.
Cada kit foi adquirido pelas prefeituras por R$ 14 mil, valor muito superior ao praticado no mercado e ao de produtos de ponta de nível internacional.
A Folha visitou nos últimos dias seis das sete cidades beneficiadas e conversou com professores, gestores municipais e moradores.
Canapi (AL) recebeu R$ 5,4 milhões para a compra de 330 kits, o equivalente a R$ 706,63 por aluno matriculado. A cidade tem 35 escolas e grandes desafios educacionais —nenhuma tem laboratório de ciências, por exemplo, e mais da metade não conta com internet.
Na escola rural Almirante Benjamim Sodré, no povoado de Cova do Casado, o pátio é de chão batido, alunos de séries diferentes precisam estudar na mesma sala e falta água encanada.
É preciso usar um balde para dar a descarga dos banheiros usados pelos alunos da educação infantil e anos iniciais do fundamental. A escola, com paredes descascadas, ainda aguarda por reforma.
Na cidade de Santana do Mundaú, os R$ 4,5 milhões recebidos pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) para a compra de robôs equivale a um gasto de R$ 1.473 por aluno.
Na escola Pequeno Príncipe, no bairro Jussara de Santana do Mundaú, os robôs já são esperados pelos educadores com certo entusiasmo, apesar de receio pela falta de algumas condições: os alunos não têm acesso a computadores, essencial para o uso dos robôs.
As cidades beneficiadas têm entre 2.749 e 11.954 matrículas. Todos os sete municípios contam com deficiências educacionais mais urgentes do que a adoção de projetos de robótica, conforme constatado pela reportagem.
Enquanto a Prefeitura de União dos Palmares recebeu R$ 7,5 milhões para a compra de kits de robótica, há três obras com recursos federais paradas na cidade. No bairro Condomínio Newton Gonçalves, o prédio que seria uma creche está apenas como um esqueleto de paredes sem telhados.
A construção, orçada em R$ 3,4 milhões, foi liberada em 2014 e, hoje, permanece paralisada com 71% de execução. A dona de casa Dayane Rodrigues, 23, mora em frente.
Em Flexeiras, há uma obra abandonada de uma creche na mesma rua da Secretaria de Educação, referente a um convênio com o FNDE de 2013.
ENTENDA O CASO
- Valor: R$ 26 milhões foi a verba do MEC direcionada para a compra de kits de robótica para escolas de ensino fundamental de pequenas cidades de Alagoas
- De onde saiu o recurso: FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação)
- Quando: a liberação do recurso ocorreu entre fevereiro e março
- Valor por unidade do kit: R$ 14 mil
- Cidades de Alagoas beneficiadas: União dos Palmares, Canapi, Santana do Mundaú, Branquinha, Barra de Santo Antônio, Maravilha e Flexeiras
- Percentual destinado a Alagoas em relação à liberação para outros estados: 67,6%
- Relação de gastos em robótica por aluno nessas cidades de Alagoas: de R$ 611 a R$ 1.473
- Empresa contratada pelas prefeituras de Alagoas: Megalic, que está em nome de Roberta Lins Costa Melo e Edmundo Catunda, pai do vereador de Maceió João Catunda (PSD), aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL)