Salvador é como um triângulo com dois lados banhados pelo mar. Mas, de suas 37 praias, 26 são consideradas ruins ou péssimas para o banho. A situação da capital baiana reflete o cenário de outras grandes cidades litorâneas: sete em cada dez praias poluídas no país estão em cidades com mais de 100 mil habitantes, informa reportagem de João Pedro, Marcelo Toledo, Carolina Linhares e Fábio Takahashi, da Folha.
A situação será mais visível neste verão, estação que começa pontualmente às 14h28 (horário de Brasília) desta quinta-feira (21).
Levantamento da Folha, com dados sobre a presença de bactérias nas águas de 1.217 praias em 13 Estados do litoral, aponta que, de janeiro a outubro deste ano, 335 praias foram consideradas ruins ou péssimas, sendo 234 delas (cerca de 70%) em cidades grandes ou médias.
A classificação anual das praias, baseada nos níveis semanais ou mensais de coliformes, porém, trata-se de uma média. Ou seja, mesmo praias consideradas boas ou regulares podem apresentar riscos.
São consideradas péssimas aquelas que estiveram impróprias em mais de 50% das medições do período. São ruins as que estiveram impróprias entre 25% e 50% das vezes, e regulares, as impróprias em até 25% das coletas. As boas são aquelas que não estiveram impróprias em nenhuma das medições.
A concentração de praias sujas em áreas urbanas resulta de fatores como deficiências na coleta e tratamento de esgoto e a poluição dos rios.
Qualidade das praias brasileiras
“No litoral de São Paulo, por exemplo, a qualidade da água da praia reflete a quantidade de pessoas no litoral. Quanto mais gente, mais esgoto”, afirma Cláudia Lamparelli, gerente da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo).
Empresas de saneamento da Bahia e de Santa Catarina apontam as ligações de esgoto clandestinas e crescimento desordenado das cidades como principal problema.
O enfrentamento requer investimento pesado em saneamento, que teve cortes orçamentários por causa da crise.
Em comparação com o ano passado, o resultado é um cenário de estagnação da qualidade das praias neste ano.
Entre as 1.217 praias monitoradas em 2017, 43% estavam boas, 30% regulares, e 28% ruins ou péssimas. Ou seja, de cada dez praias, cerca de três estavam ruins ou péssimas. Em 2016, 29% de 1.180 praias tinham essa situação.
MIGRAÇÃO PRAIANA
Entre as dez capitais com dados da chamada balneabilidade, quatro não têm nenhuma praia própria em todas as medições: Fortaleza, Recife, São Luís e Vitória.
Em Salvador, só quatro praias estiveram boas em todas as medições. São as mais afastadas do centro. Já as que ficam na região central, como Barra, Ondina e Rio Vermelho, têm qualidade ruim. No Rio, praias da zona sul como Copacabana, Ipanema e Leblon são apenas regulares.
Isso resulta numa “migração de fim de semana” de turistas e moradores para locais menores e mais distantes.
De Salvador, o destino é o litoral norte, onde fica, por exemplo, a Praia do Forte. Já Fortaleza perde espaço para destinos como Jericoacoara.
Das 522 praias consideradas próprias em 100% das coletas e classificadas como boas em 2017, 369 (cerca de 70%) estão em cidades com menos de 100 mil habitantes.
Também há exceções em cidades pequenas, como Bombinhas (SC), com 14 mil habitantes e trechos impróprios.
O banho em locais que não têm condições adequadas aumenta a chance de contaminação por vírus e bactérias. A doença mais comum é a gastroenterite, que causa enjoo, diarreia, dor de cabeça e febre.
Outros problemas são micoses e infecções nos olhos e ouvidos. Crianças e idosos são mais suscetíveis.
Questões sazonais também provocam variação na qualidade das praias. Temperatura, luminosidade e principalmente a chuva determinam a presença de bactérias na água.
“Quando chove, a gente já fica esperando um valor mais alto [de coliformes fecais]. A água de escoamento superficial lava tudo que está na cidade e leva para canais e córregos, que terminam no mar”, diz Lamparelli.
Foi o que aconteceu na praia do Farol da Barra, em Salvador, que amanheceu no último domingo (17) com um córrego de água esverdeada cruzando a areia.
No final de semana, a praia foi considerada imprópria pelo Inema (Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos), órgão ambiental da Bahia. Mesmo assim, estava cheia. Turista de Pernambuco, o estudante Erles Vieira, 22, não deixou de frequentar o local. “A praia me pareceu limpa em comparação às que costumo ir no Recife”, disse.
Já o recepcionista Carlos Roberto Santos, 33, manteve sua rotina de surfe: “Frequento deste criança, não vou mudar isso”.