O Ministério Público da Paraíba requisitou que a Associação dos Notários e Registradores da Paraíba (Anoreg) remeta, no prazo de 20 dias, informações documentais acerca das procurações públicas, testamentos, doações em vida, escrituras públicas e registro de imóveis, lavrados nos cartórios e tabelionatos de João Pessoa, e respectivas atas notarias, envolvendo pessoas idosas, nos quais constem cláusulas de plenos e ilimitados poderes, irrevogabilidade, irretratabilidade, prazo indeterminado, autorização para empréstimos, compra e alienação de imóveis. A requisição faz parte de um procedimento administrativo instaurado pela 46ª promotora de Justiça da Capital, Sônia Maria de Paula Maia.
Segundo a promotora, devem ser encaminhadas os documentos lavrados de 2 de janeiro deste ano até a data da vigência da Recomendação n° 46/2020 da Corregedoria Nacional de Justiça que dispõe sobre medidas preventivas para que se evitem atos de violência patrimonial ou financeira contra pessoa idosa, especialmente vulnerável no período de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin), no âmbito das serventia extrajudiciais e da execução dos serviços notariais.
A promotora informou que a Anoreg, com suporte na Recomendação n° 46/2020, lançou a Campanha “Cartório Protege Idoso”. “Entretanto, na cidade de João Pessoa, alguns cartórios não estão adotando as medidas de preventivas para ajudar a coibir a prática de violência patrimonial ou financeira, moral, psicológica e até mesmo física, contra pessoas idosas em situação de risco pessoal e vulnerabilidade social”, acrescentou.
Ainda conforme a promotora, nas procurações públicas, continuam constando a outorga de poderes amplos e ilimitados, chamadas cláusulas Ad Judicia, de irrevogabilidade, irretratabilidade, prazo indeterminado. Com isso, explica a promotora, o procurador pode, como bem lhe convier, comprar, vender imóveis de propriedade do outorgante, contrair empréstimos e, praticar enfim, atos que na maioria das vezes redundam em prejuízo ao idoso sem discernimento ou sem capacidade suficiente para entender e compreender a extensão dos atos conferidos ao outorgado.
Procedimento
De acordo com a promotora, o procedimento foi instaurado em razão de um idoso com histórico de etilismo crônico que outorgou procuração a uma mulher sem qualquer vínculo familiar ou afetivo. Foi informado que, no ato da internação, uma mulher apresentou-se como procuradora do idoso, afirmando, no entanto, que não poderia ficar como sua acompanhante, pois tinha filhos menores.
Conforme o relatório encaminhado à promotora, o paciente apresentava momentos de lucidez e outros de desorientação, não tendo, pois, condições de informar os nomes e cidades onde seus filhos residiam. Essa situação chamou a atenção do Serviço Social do Hospital Universitário Nova Esperança, principalmente em razão dos termos consignados na procuração pública lavrada com cláusula dando plenos poderes.
O Serviço Social realizou diligências e conseguiu localizar os filhos do idoso em Jacareí, São Paulo. “Há 19 anos o ancião deixou de manter contato com a família, que não sabia do seu paradeiro. Um dos filhos, tão logo tomou conhecimento que o pai estava hospitalizado em João Pessoa, veio ao seu encontro, para restabelecer os laços de família”, complementou.
Por isso, a promotora requisitou que o hospital encaminhe relatório social circunstanciado sobre o paciente informando, inclusive, os contatos e endereços dos seus familiares, para eventual oitiva na Promotoria de Justiça.
Também foi requisitado do cartório que lavrou a procuração as providências adotadas o âmbito notarial para cumprimento dos ordenamentos legais em consonância com a Recomendação nº 46/2020, da Corregedoria Nacional de Justiça.
Legislação
A promotora destaca que o Estatuto do Idoso determina que nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei. Além disso, configura crime “apropriar-se ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade.
Também é crime induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente e lavrar ato notarial que envolva pessoa idosa sem discernimento de seus atos, sem a devida representação legal.
“O Ministério Publico, através da Promotoria de Defesa da Cidadania e do Idoso, conclama os cartórios de João Pessoa a, efetivamente, fazerem cumprir a Recomendação da Corregedoria Nacional de Justiça e divulgar e por em prática a campanha, Cartório Protege Idosos”, diz a promotora.