O Brasil gasta mais com funcionalismo que do EUA, Portugal e França. Em relatório divulgado nesta terça-feira (21), o Banco Mundial mostra que os gastos do país com servidores (de todas as esferas de governo) alcançaram 13,1% do PIB em 2015 (último dado disponível). Há dez anos, o número era de 11,6%, o que colocava o Brasil atrás dos europeus.
Outros países desenvolvidos, como Austrália e EUA, gastam consideravelmente menos —a massa salarial equivale a cerca de 9% do PIB, informa reportagem de Mariana Carneiro e Maeli Prado, da Folha.
Mas o gasto superior do Brasil não se deve a um inchaço ou excedente de funcionários a serviço da população, segundo o Banco Mundial. Mas sim à remuneração acima da média dos servidores, principalmente os funcionários do serviço público federal.
Segundo dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho), reunidos pelo banco, no Brasil 5,6% da população empregada está no setor público. Nos países da OCDE, entre os quais os mais ricos do mundo, este percentual é de quase 10%.
“Isso indica que o motivo de a massa salarial do setor público brasileiro ser tão alta é o elevado custo dos servidores públicos (altos salários), em vez do excessivo número de servidores”, afirma relatório.
NO TOPO
A desigualdade salarial em favor dos funcionários públicos também é elevada quando comparada às remunerações no Brasil.
Segundo levantamento do Banco Mundial com base nos dados do IBGE, o setor público paga em média salários 70% mais elevados do que os pagos pela iniciativa privada formal —R$ 44.000 contra R$ 26.000 por ano— e quase três vezes mais do que recebem os trabalhadores informais (R$ 16.000 anuais).
“O governo federal paga salários ainda mais altos. Com base em dados de 2016, os militares brasileiros recebem, em média, mais do que o dobro pago pelo setor privado (R$ 55.000 por ano), e os servidores federais civis ganham cinco vezes mais que trabalhadores do setor privado (R$130.000 por ano). A remuneração média por funcionário é excepcionalmente alta no Ministério Público Federal (R$ 205.000 por ano), no Poder Legislativo R$ 216.000 por ano) e no Poder Judiciário (R$ 236.000 por ano)”, compara o relatório.
Isso coloca os servidores federais no topo da pirâmide de renda do Brasil – 93% do funcionalismo civil do governo federal faz parte do 40% mais rico da população brasileira. Sete em cada dez destes funcionários integra o grupo dos 10% mais ricos do país.
FORA DO PADRÃO
Se controlados os efeitos de nível educacional, cor e gênero —motivos que ajudam a explicar a diferenças salariais no Brasil—, o funcionário público do governo federal tem um prêmio salarial 67% superior ao de semelhantes do setor privado.
É o maior prêmio pago a servidores públicos em uma comparação com um grupo de 53 países e superior ao de todas as nações que integram a OCDE, o que coloca o Brasil como um “outlier” nesse quesito [caso fora do padrão, no jargão estatístico], segundo o Banco Mundial.
No caso dos servidores estaduais, ainda há um prêmio salarial de 30% sobre os semelhantes da iniciativa privada. Apenas entre os funcionários das prefeituras é que o prêmio desaparece. Ou seja, ganha-se mais ou menos a mesma coisa no setor público ou no setor privado.
O objetivo do relatório do Banco Mundial é apontar possíveis frentes de controle de gastos, que contribuam para o ajuste fiscal sem afetar os mais pobres.
“O Estado brasileiro é grande como um Estado europeu. Maior que EUA, Austrália e quase tão grande quanto o Japão. Na Europa, porém, o Estado faz transferências e assim reduz as desigualdades. No Brasil, há transferências, mas não se reduz a desigualdade. Qual é benefício para a população, quem se beneficia? Os pobres se beneficiam menos [dessas transferências]”, afirma Martin Raiser, diretor do Banco Mundial para o Brasil.
A redução do abismo salarial entre funcionários públicos federais e os trabalhadores da iniciativa privada à metade levaria a uma economia de R$ 53 bilhões (0,9% do PIB), segundo o Banco Mundial.
Se o Brasil passasse a seguir os padrões internacionais (16% de prêmio salarial), a economia seria de R$ 79 bilhões —1,3% do PIB, quase a economia prevista na próxima década com a reforma da Previdência (1,8% do PIB).
Isso seria possível mantendo os salários congelados até 2024, calcula o Banco Mundial. A suspensão de reajustes, acionada pelo governo em 2018, no entanto, provocou forte reação do funcionalismo, que promete pressionar congressistas para que não autorizem o congelamento pelo governo federal.
EVOLUÇÃO
Embora os Estados tenham sido responsáveis por boa parte do aumento dos gastos com pessoal desde 2013 –um dos motivos que os levaram à atual crise dos governadores—, o governo federal aumentou a remuneração dos servidores de maneira acelerada entre 2003 e 2010.
O Banco Mundial ressaltou que, entre 2003 e 2010, o número de servidores aumentou em média 2% por ano. Já a remuneração cresceu 7%, em termos reais (descontada a inflação).
Nos governos subnacionais, a contratação e a remuneração cresceram pari passu –o custo aumentou 2,5% ao ano (em termos reais) e o número de funcionários, 3%.