A comissão especial da Câmara dos Deputados deverá concluir nesta terça-feira (21) a votação do projeto que inclui na Constituição a garantia do direito à vida “desde a concepção”, o que, na prática, pode proibir o aborto nas situações atualmente previstas na legislação.
O texto-base do projeto foi aprovado há duas semanas, por 18 votos a 1, mas falta a análise de destaques, propostas que podem alterar o conteúdo original, informa reportagem de Fernanda Calgaro e Alessandra Modzeleski, do G1.
Se o projeto for aprovado pela comissão, seguirá para votação no plenário da Câmara, em dois turnos. Em seguida, se o texto passar, a análise caberá ao Senado.
Pela lei atual, o aborto é permitido em três situações:
- Em caso de estupro;
- Quando há risco para a vida da mulher;
- Se o feto for anencéfalo.
Mas a proposta em análise na Câmara inclui na Constituição a garantia do direito à
vida “desde a concepção”.
O que diz o relator
Ao G1, o relator da proposta, Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), afirmou que o objetivo da PEC não é proibir totalmente o aborto, como em casos de estupro.
“Eu não mexo em nada no Código Penal nem na permissão do aborto no caso de estupro ou de a mãe correr risco de vida. Não é para mexer no caso de estupro. Eu tenho filha, jamais faria uma coisa dessas”, afirmou Mudalen.
Em seguida, acrescentou que o foco é derrubar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou que a interrupção da gravidez até o terceiro mês de gestação não configura crime.
Críticas ao projeto
Deputados contrários ao texto, porém, argumentam que, na prática, o parecer de Mudalen abrirá brecha para vetar o aborto até mesmo nas circunstâncias permitidas na lei atual.
“É um feminicídio simbólico. Eles tornam as mulheres invisíveis nessa situação. Acham que são donos dos nossos corpos. O texto mexe na Constituição, que tem um poder jurídico superior ao do Código Penal, onde estão previstos os casos em que hoje o aborto é permitido”, afirma a deputada Erika Kokay (PT-DF), integrante da comissão.
Ela diz acreditar que a maior parte dos parlamentares não será favorável à aprovação da proposta, chamada por ela de “retrocesso”.
Foram apresentadas, ao todo, dez propostas para mudar o conteúdo da PEC.
Protestos
A aprovação do texto-base na comissão teve repercussão negativa em parte da sociedade.
A polêmica levou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por exemplo, a se manifestar no Facebook para dizer que proibir o aborto em casos de estupro “não vai passar” na Casa.
A medida também gerou protestos pelo país. No dia 13 de novembro, com cartazes e palavras de ordem, manifestantes percorreram as principais vias do centro de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Amapá e Belém, além de outras capitais.
Reação ao STF
A comissão especial da Câmara que analisa a proposta foi criada para revisar a decisão do STF de não considerar crime o aborto até o terceiro mês de gestação.
Em novembro do ano passado, os ministros da Primeira Turm a discutiram a revogação da prisão preventiva de cinco médicos e funcionários de uma clínica de aborto. A decisão valeu somente para este caso específico, mas abriu precedente para descriminalizar o aborto.
Pelo Código Penal, a mulher que aborta, fora das situações permitidas, está sujeita a prisão de um a três anos. Já o médico que fizer o aborto pode ficar preso por até 4 anos.
Em reação ao julgamento no Supremo, o presidente da Câmara criou no mesmo dia a comissão. Na ocasião, Maia afirmou que o STF tinha legislado no lugar do Congresso e, por isso, a Casa precisaria se manifestar.