O que, à primeira vista, pode parecer um local sem grandes atrativos turísticos, tem se revelado com enorme potencial para o ecoturismo. Um olhar atento da Associação de Turismo de Cuité (Atuc) identificou inscrições rupestres, ruínas de antigas casas-grandes, locais sagrados e belezas naturais – que incluem cânions e trilhas ecológicas -, nos dois assentamentos da reforma agrária do município de Cuité, na região do Agreste da Paraíba, em uma área de abrangência do Semiárido, na divisa com o Rio Grande do Norte.
Desde o ano passado, os atrativos turísticos das duas áreas – os assentamentos Retiro e Batentes -, estão sendo identificados e qualificados pela associação para que as famílias possam ampliar as ofertas de atrações / acomodações e assim gerar nova fonte de renda com o turismo rural de base comunitária.
O “Relatório das Potencialidades e Oportunidades de Negócios com Turismo de Base Comunitária dos Assentamentos Retiro e Batentes”, que está sendo construído pela Atuc em parceria com as associações de moradores dos dois assentamentos, já está em fase de conclusão. “Depois de pronto, o relatório pode servir como norte para as ações que precisam ser realizadas nas comunidades. Também pretendemos encaminhar aos órgãos e instituições competentes solicitações para a realização de obras necessárias de adequação desses atrativos”, afirmou Tarcísio Azevedo, integrante da Atuc responsável pela elaboração do relatório.
Além do representante da associação – entidade que atua há 14 anos com a identificação de potencialidades de turismo rural na região –, outras seis pessoas estão envolvidas na produção do relatório, sendo os dois líderes das associações, um professor universitário e três moradores voluntários. “Identificamos que havia muitos atrativos naturais, históricos, culturais e religiosos nestes assentamentos, mas a população não dispunha de um inventário, o que impedia que estes atrativos fossem explorados como turismo rural e gerassem renda para as famílias assentadas. Com organização, esses atrativos turísticos darão bons frutos às famílias assentadas”, disse Azevedo.
De acordo com o presidente da associação dos moradores do assentamento Retiro, Cícero Pedro da Silva, as famílias dos dois assentamentos precisavam do incentivo e do apoio de alguma entidade para fazer o levantamento dos atrativos turísticos do assentamento. “É importante a gente saber que nós podemos ter renda com outras coisas que já existem no assentamento, como a pescaria, as trilhas. Temos muitas coisas que podemos fazer aqui. Faltava apenas o interesse”, afirmou. “Com o trabalho da Atuc, pudemos reconhecer esse potencial”.
Somados, os assentamentos Retiro e Batentes, distantes cerca de 240 quilômetros da capital João Pessoa, têm aproximadamente sete mil hectares, onde vivem cerca de 250 famílias de agricultores.
Manifestações culturais e religiosas
As duas comunidades também mantêm vivas tradições religiosas iniciadas há pouco mais de meio século – como a procissão de Nossa Senhora de Fátima, realizada todos os anos em 13 de maio. Dezenas de fiéis de toda a região seguem de uma capela dedicada a São José, no assentamento Batentes, até a capela de Nossa Senhora de Fátima, construída em cima de um monte, no mesmo assentamento, onde participam de uma missa. O local é um conhecido ponto de romaria da região, onde é comum ver pessoas pagando promessas.
Há ainda um sítio arqueológico com inscrições rupestres em um paredão de pedra, conhecido como “Pedra da Letra”, que foi descoberto apenas durante a execução do projeto da Barragem do Retiro. Algumas pinturas foram submersas pela água após a formação do reservatório.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) também identificou a existência de uma oficina lítica – sítio arqueológico onde se encontram artefatos feitos de pedra, como ferramentas e utensílios. Esse é um local importante para entender como as sociedades antigas utilizavam pedras para suas necessidades diárias.
Até os dias de hoje, algumas famílias lavam roupas em tanques de pedra escavados pela natureza em lajeados e é forte a cultura de andar a cavalo e de participar de vaquejadas.
As ruínas de uma antiga “casa-grande” guardam um pouco da história da ocupação do imóvel rural que deu origem ao assentamento Retiro. Segundo os moradores e documentos antigos, no local vivia uma comunidade religiosa que se mantinha com a criação de gado e mão de obra escrava.
Atrativos naturais
Existem cinco reservas ambientais na área que compreende os assentamentos Retiro e Batentes. Uma delas é a Reserva Ecológica Olho D’Água do Negro, com trilhas, cânion e mirante, onde o turista vai poder conhecer a diversidade da fauna e da flora do bioma Caatinga ao percorrer antigas trilhas de percurso longo.
Azevedo contou que uma das ideias é inserir as trilhas que percorrem os assentamentos na Rede Nacional de Trilhas de Longo Curso e Conectividade – Rede Trilhas, um sistema nacional sem fins lucrativos que reúne trilhas organizadas para a geração de emprego e renda às famílias da região e, sobretudo, funcionem como ferramentas reconhecidas pela legislação brasileira para ampliar a conectividade entre áreas preservadas, garantindo a manutenção da vida selvagem e a melhoria de indicadores ecológicos.
Outra fonte de renda a ser explorada é a realização de acampamentos com programação incluindo, além da realização de trilhas, banhos monitorados, passeios de canoa e pescaria.
A região também possui áreas com potencial para a prática de esportes radicais, como a escalada e o rapel. “Para implementarmos todas essas ideias, precisamos reunir apoios por parte dos moradores, da iniciativa privada e principalmente, de órgãos públicos”, ressaltou Azevedo.
Barragem do Retiro
Além de atrativos naturais e culturais, a região abriga, desde 2022, um dos maiores reservatórios de água da Paraíba: a Barragem do Retiro, como também é conhecida a Barragem Pedro Simões Pimenta ou Barragem do Japi. Construída na bacia do rio Japi, na área do assentamento Retiro, o mais recente atrativo turístico da região foi inaugurado em 2022.
O reservatório tem capacidade de armazenamento de 40,5 milhões de metros cúbicos e será responsável pelo abastecimento de água de cerca de 45 mil pessoas na região do Curimataú paraibano, englobando moradores das áreas rural e urbana, e dando suporte à irrigação, à piscicultura e a atividades de lazer. A obra era uma reivindicação da população local há cerca de 50 anos e recebeu investimentos de R$ 70 milhões dos governos federal e estadual.