A comunicação de doenças, acidentes ou assuntos mais delicados requer uma habilidade e preparação
Quem nunca passou pela situação de atender o telefone e do outro lado da linha o interlocutor falar: “tenho uma notícia não muito agradável para lhe dizer”? Pois é, numa situação como essa, a pessoa começa a ficar nervosa e pensa logo se aconteceu uma tragédia e morreu alguém. A comunicação de doenças, acidentes ou assuntos mais delicados para parentes ou amigos mais próximos requer uma habilidade e preparação por quem tem a responsabilidade de fazê-la.
“Processos de adoecimento ou assuntos sérios devem ser avaliados e planejados para que essa comunicação não cause danos maiores do que o fato já causa. É importante observar como essas pessoas se encontram, se estão sozinhas ou acompanhadas, qual a linguagem que permite que elas possam compreender o que está sendo dito, buscar um local tranquilo e acolhedor, se possível. O WhatsApp não é um recurso indicado para esse tipo de comunicação”, orienta a psicóloga especialista em luto do Morada da Paz, Simône Lira.
Foi então, através do WhatsApp, que a professora Sandra da Silva, 58 anos, soube, recentemente, que um grande amigo tinha sofrido um Acidente Vascular Cerebral (AVC). A notícia e a forma como a recebeu a deixaram muito abalada emocionalmente. “Passado o susto inicial, cheguei até a reclamar com a pessoa que me deu a notícia, dizendo que um assunto como esse não deveria ser informado por telefone e muito menos por WhatsApp. Isso é falta de bom senso, eu acho totalmente indelicado, esses assuntos não devem ser falados pelo celular. A forma mais correta seria presencial”, afirma.
De acordo com a psicóloga do Morada da Paz, no caso de comunicar o óbito de um ente querido, ainda mais no caso de mortes repentinas quando ninguém estava esperando, deve-se abrir espaço para ouvir a pessoa que recebe a notícia e permitir que, muitas vezes, algumas reações, até mesmo de revolta, possam ser acolhidas e validadas diante da dor do rompimento de um vínculo significativo. “Ter o cuidado e a clareza em uma comunicação honesta, respeitosa e orientando como proceder a partir daquele momento estaremos agregando um recurso protetivo para evitar complicações diante de momentos de crise”, destaca a psicóloga.
Receber a notícia da morte de alguém costuma ser muito impactante para as pessoas. “Isso acontece porque vivemos em um mundo onde falar de morte é quase que chamá-la para perto de nós, como se tivéssemos o controle de tudo que nos acontece, inclusive a nossa hora de morrer. Nesse sentido, temos a finitude como uma grande aliada em nossa existência. Através dela podemos refletir qual o sentido de nossa vida e o legado que gostaríamos de deixar para os que ficam e tiveram a oportunidade de nos conhecer”, explica Simône Lira.
A profissional ressalta que é importante não esquecer que, quando acontece a morte de alguém, as famílias enlutadas ficam e merecem respeito. “Escolher, naquele momento, algum familiar que esteja um pouco mais estabilizado emocionalmente, para que este possa comunicar aos demais, de forma cuidadosa e tranquila sobre o óbito do ente. Quando as pessoas enlutadas se sentem respeitadas e validadas diante de sua dor, com possibilidades de realizar despedidas e ritos que façam sentido para essa existência, fazemos com que esse processo de luto possa ser vivenciado dentro do que é esperado, com momentos de dor, raiva, culpa, alegria, sensação de alívio, em meio a um misto de emoções”, recomenda.
Imprensa e Redes Sociais – Na ânsia de “dar o furo de reportagem”, muitos veículos de imprensa e perfis nas redes sociais noticiam a morte de alguma personalidade antes mesmo da família saber. Isso pode gerar um sofrimento muito grande para os parentes ao ser impactado pela notícia.
“O furo de reportagem como notícia da morte de alguém pode ser um fator complicador para processos de luto, com ainda mais agravantes a depender da forma publicada e palavras utilizadas. Já parou para pensar o que significa acessar um site ou rede social e se deparar com a notícia de morte de alguém que você ama quando muitas vezes acreditava que essa pessoa estava em casa, em uma viagem, ou em casos de adoecimento, à espera de uma melhora? Em todas as áreas a ética e a humanidade não podem e nem devem ser esquecidas”, reflete a psicóloga.
Por outro lado, quando a família já foi comunicada e autoriza a veiculação da notícia por se tratar de um caso de repercussão ou uma figura pública, há a possibilidade de uma despedida realizada pelos fãs, por exemplo. “É importante que os familiares sejam respeitados em seus desejos diante dos rituais e despedidas realizados por eles”, aconselha Simône Lira.