Em 2020, o cineasta paraibano Torquato Joel filmou seu segundo longa-metragem, Corpo da Paz. No percurso para levar o filme à tela faltou verba para terminá-lo. “Foi um sufoco. Houve quebra da produção”, conta o diretor. O trabalho de conclusão da obra só foi retomado agora, graças aos recursos da Lei Paulo Gustavo (LPG). O lançamento deverá ser realizado até o final do ano. “A Lei nos trouxe um benefício fantástico”, completa.
Contemplado em um dos editais da LPG do governo estadual da Paraíba, o projeto recebeu R$ 100 mil para a finalização do som – da edição à trilha sonora. “A Lei, que é emergencial, precisa ser permanente, pois o maior foco é o cinema. E nós temos aqui uma produção forte, com uma série de projetos de capacitação”, defende Torquato, que atua como coordenador-geral de duas iniciativas de interiorização do cinema: o Projeto ViAção Paraíba, de difusão de audiovisual, e o Jabre – Laboratório para Jovens Roteiristas.
Com 13 curtas na bagagem, entre eles, Passadouro, premiado em festivais de cinema no país, o cineasta concebeu Corpo da Paz como uma produção no formato, para depois transformá-la em longa. De teor autobiográfico, relata experiências de infância no sertão na época da ditadura. “É um filme sobre memória, e memória é algo fundamental”, frisa.
“A Lei Paulo Gustavo tem sido uma experiência enriquecedora e de aprendizado em todo o país. São grandes desafios, mas também uma profusão de possibilidades. Ser a primeira política pública com o maior volume de recursos financeiros repassados especificamente para o audiovisual em todos os estados e para 98% dos municípios do país significa ativar as condições locais nos diferentes elos da cadeia – produção, exibição, difusão, mostras, cineclubes, distribuição, formação, preservação, pesquisa, salas de cinema, entre outros”, afirma a diretora de Preservação e Difusão Audiovisual da Secretaria do Audiovisual (SAV), Daniela Fernandes.
E acrescenta: “A LPG representa em si uma potência grande para construção de políticas estruturantes em todo o Brasil, de Norte a Sul, ainda mais para regiões que historicamente receberam menos recursos para investir no seu audiovisual, como as regiões Norte e Nordeste.”
Tribos indígenas
Também beneficiado em edital da Lei Paulo Gustavo no âmbito estadual, Encontro das Tribos Indígenas de Carnaval obteve R$ 50 mil para a sua segunda edição, atualmente em pré-produção. Com o valor, a iniciativa do Coletivo Jaraguá, organização da sociedade civil que busca difundir a cultura popular da Paraíba, foi ampliada. “Conseguimos fazer um evento maior, chamar pessoas de fora para participar da mesa e ainda permitir a participação do público”, salienta o antropólogo e integrante do coletivo, Lucas Peregrino, que já pensa em uma edição regional. “É uma ideia que vem desde o nascimento do projeto”, adianta.
Prevista para o final do segundo semestre de 2024, a atividade, com duração de dois dias, contará com plenária, na qual serão apresentadas reivindicações dos grupos, palestras e oficinas.
Manifestação cultural que engloba música, dança, encenação e poesia oral, as tribos indígenas são uma tradição da folia na capital paraibana, onde desfilam no Carnaval Tradição. Foram reconhecidas como Patrimônio Cultural do Estado por meio de lei sancionada em 2022.
De acordo com Lucas, somente na Grande João Pessoa existem 11 grupos, entre eles, Tupinambás, Xavantes, Guanabara, Tabajara, Pele Vermelha e Ubirajara. Seus componentes são pessoas que podem ou não se autodeclararem indígenas.
Investimento
A Paraíba figura como ente federado que mais utilizou os recursos da Lei no país – 93,1% pelo estado e 81,9% pelos municípios, de acordo com o painel de dados da Lei Paulo Gustavo. Do total de R$ 88,4 milhões, o governo estadual gerencia R$ 48,7 milhões, e o restante é dividido entre as cidades.
A coordenadora do Escritório Estadual do MinC na Paraíba, Rejane Nóbrega, analisa o bom resultado. “É um processo amplo de mobilização que vem desde as oitivas com a sociedade civil, fazendo lives de tira-dúvidas para que todos os agentes se envolvessem na construção da política pública. Com isso vamos colhendo os frutos, num processo regionalização dos editais, fazendo com que o estado tenha a maior execução da LPG do país”.
Ao todo, o Nordeste brasileiro recebeu R$ 1,1 bilhão da Lei Paulo Gustavo para estados e municípios.
A Lei disponibilizou R$ 2 bilhões aos estados e R$ 1,8 bilhão às cidades brasileiras, num total de R$ 3,8 bilhões, com descentralização de recursos. O montante é oriundo do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) e do Fundo Nacional de Cultura (FNC).
Criada para socorrer profissionais do setor cultural prejudicados pela baixa atividade econômica durante a pandemia de Covid-19, a LPG teve adesão de 98% dos municípios do país e 100% dos estados. O prazo final de execução da LPG é 31 de dezembro de 2024.
Para Pernambuco, o repasse foi de R$ 185 milhões – R$ 100,1 milhões para projetos a serem executados pelo estado e R$ 84,8 milhões para os municípios. Das cidades, 70,2% delas já utilizaram os valores da Lei.
Foto: Alfredo Neto
Reisado
Em Santa Maria da Boa Vista, no sertão do estado, o Coletivo Movimento Viva Reis conseguiu viabilizar o projeto audiovisual Nossa História, sobre o reisado, graças à LPG. Foram obtidos R$ 13,3 mil para a realização, por meio de edital da prefeitura local.
O trabalho busca transmitir às novas gerações a tradição, por meio do Grupo de Reisado Mirim da Comunidade Quilombola de Inhanhum, composto por sobrinhos, netos e outros descendentes dos mestres e mestras da manifestação popular. É uma ramificação do grupo adulto, reconhecido como Patrimônio Vivo de Pernambuco.
“Era um sonho concretizar esse projeto, e a LPG nos deu essa oportunidade”, afirma o produtor cultural e integrante do coletivo, Alfredo Neto, a respeito da ação que retrata o bem cultural que combina música, dança, personagens, encenação de entremeios, louvação e cortejo e está ligado às tradições do catolicismo, sobretudo em celebrações do ciclo natalino e às festas dos Santos Reis.
Em processo de edição, o vídeo será veiculado nas redes sociais. “É onde a garotada está”, justifica Alfredo. Antes, ganhará exibição na nova edição do Encontro de Mestres do Reisado, em maio, ação do projeto Viva Reis – Sementeira de Reisado. A proposta visa difundir saberes tradicionais dos reisados do sertão do São Francisco para suas comunidades.
“A LPG, ao contribuir para a recuperação de estados e municípios e ao incentivar os setores econômicos vinculados aos setores criativos, demonstra a importância da economia criativa e da preservação da cultura popular e das tradições locais para o crescimento do País. Além de gerar pertencimento, cultura também gera emprego, renda e desenvolvimento socioeconômico”, salienta a diretora de Desenvolvimento Econômico da Cultura da Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural (Sefic), Andrea Guimarães.
A execução dos recursos da Lei pelos estados e municípios pode ser acompanhada pelo painel de dados da LPG. Clique aqui para acessar.