O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e o Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) deflagraram, nesta quarta-feira (26/07), a operação Escoliose, de busca e apreensão, em três estados da região Nordeste. O objetivo é apurar formação de cartel por organização criminosa que atua no setor de comércio de órteses, próteses e materiais especiais (OPME) utilizados em cirurgias ortopédicas. Duas advogadas e um médico ortopedista são apontados como organizadores de esquema fraudulento.
A operação Escoliose cumpriu 24 mandados de busca e apreensão nas cidades de Natal (RN), Recife (PE), João Pessoa (PB) e Campina Grande (PB). Além do Cade e do MPRN, a ação contou com a colaboração dos Ministérios Públicos da Paraíba e de Pernambuco e das polícias civil e militar desses estados. Ao todo, participaram da operação 30 servidores do Cade, 19 promotores de Justiça, 56 servidores dos MPs e mais de 100 policiais militares e civis.
As investigações tiveram início em 2019. O MPRN apurou que o grupo, através de articulação ilícita, criava demandas judiciais com o direcionamento de cirurgias emergenciais de escoliose. Na judicialização, obtinham vantagem econômica fraudulenta através do superfaturamento na compra de OPME para realização de procedimentos cirúrgicos em prejuízo da Administração Pública.
No período investigado, as duas advogadas ingressaram com, pelo menos, 46 processos judiciais – entre ações com pedido liminar e mandados de segurança – que totalizaram um valor de cerca de R$ 7,4 milhões, pagos pelo estado do Rio Grande do Norte para custeio das cirurgias ortopédicas. Desses 46 processos, 42 foram vencidos pela clínica de propriedade do médico investigado, que atuava em conjunto com as advogadas.
De acordo com as investigações, para obtenção da liminar contra o poder público, as advogadas procediam à indicação dos orçamentos de clínicas e hospitais aptos à realização do procedimento e ao fornecimento dos materiais. Essas propostas eram apresentadas por um grupo de fornecedores, favorecendo o médico investigado e determinadas empresas do ramo de OPME.
Os orçamentos eram feitos de maneira acordada entre as empresas indicadas pelas advogadas, que, ao invés de concorrerem, deixavam pré-estabelecido quem seria beneficiada com a contratação determinada judicialmente, forjando uma pesquisa de preços de mercado e apresentando propostas de cobertura. O rodízio entre elas possibilitava o direcionamento das participantes do esquema e a cobrança de um valor exorbitante.
Segundo as investigações, existem indícios que, pelo menos, 21 sócios e funcionários das empresas fornecedoras de OPME obtiveram vantagem ilícita em prejuízo ao erário. Eles também abusaram do poder econômico, dominando o mercado e eliminando a concorrência. Há, ainda, suspeitas de superfaturamento no fornecimento de materiais de alto custo e nos serviços médico-hospitalares.
O MPRN obteve o bloqueio e a indisponibilidade de contas bancárias, imóveis e veículos dos investigados. O material apreendido será analisado para se tentar descobrir se há outras pessoas ou empresas envolvidas no suposto esquema.
Os investigados poderão responder por infrações contra a ordem econômica previstas na Lei de Defesa da Concorrência, crimes contra a ordem econômica, organização criminosa e outros delitos que eventualmente forem constatados no curso da investigação.
O Cade é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública e tem como missão zelar pela livre concorrência no mercado, sendo a entidade responsável, no âmbito do Poder Executivo, não só por investigar e decidir, em última instância, sobre a matéria concorrencial, como também fomentar e disseminar a cultura da livre concorrência.
Empresas participantes de um cartel estão sujeitas a multas administrativas aplicadas pelo Tribunal do Cade que podem alcançar até 20% de seu faturamento no ano anterior ao de instauração do processo, no ramo de atividade afetado pelo cartel. Já as pessoas físicas podem ser punidas em até 20% do valor das penas aplicadas às empresas.
O outro lado:
Em nota, a empresa Waymed Comércio de Órteses e Próteses LTDA informou que irá colaborar com a justiça e afirma que sua conduta será provada como lícita ao final das investigações.
Leia na íntegra.
“Em esclarecimento aos fatos divulgados pela Operação Escoliose, primeiramente, reiteramos o nosso compromisso em atuar de acordo com todas as normas e regulamentações aplicáveis ao nosso setor. A qualidade, a ética e a conformidade com as leis são princípios fundamentais que norteiam todas as nossas atividades. Utilizamos rigorosos processos de controle de qualidade, buscando sempre garantir a segurança e a eficácia dos materiais hospitalares que disponibilizamos.
É de nosso interesse cooperar plenamente com o andamento da investigação, fornecendo todos os documentos e informações necessárias para que a verdade dos fatos seja esclarecida de maneira completa e justa.
Estamos comprometidos em colaborar com a justiça e acreditamos que, ao final da investigação, as alegações feitas contra nossa empresa serão esclarecidas e nossa conduta será comprovada como idônea.
Colocamo-nos à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos adicionais que possam ser necessários para a elucidação dos fatos e para que a verdade prevaleça”.