A bancada do PT na Câmara protocolou na Procuradoria-Geral da República uma notícia-crime responsabilizando o ex-presidente Jair Bolsonaro e a senadora eleita Damares Alves (Republicanos-DF), ex-ministra da Família, Mulheres e Direitos Humanos, pela crise humanitária que vive a população Yanomami em Roraima. Especialistas consideram a política de fomento ao garimpo como a principal causa da emergência.
A emergência nas terras Yanomami ganhou notoriedade após a inspeção pelo presidente Lula nesse sábado, quando se deparou com um surto generalizado de fome, malária e doenças respiratórias na região. “Crianças e adultos em situação de elevada subnutrição, cadavéricas, numa realidade que não deveria existir num país que ano após ano tem recordes na sua produção agrícola e alimenta diversas Nações e povos”, descrevem os parlamentares.
A causa principal dessa fome, de acordo com os deputados, é a elevada atividade do garimpo na região que tem a pesca como principal fonte de alimentação. Além do mercúrio utilizado para separar o ouro dos demais minérios, os rios ao redor são contaminados com os depósitos da substância retidos no solo amazônico. O mercúrio então contamina os peixes, que provocam uma intoxicação irreversível nos que consomem, que passam a sofrer com a perda de capacidade motora.
Além de apontar para o fato de Bolsonaro ter adotado políticas de fomento e proteção ao garimpo na Amazônia, os parlamentares consideram que houve omissão dos órgãos encarregados de proteger a comunidade Yanomami, em especial o Ministério da Família, da Mulher e dos Direitos Humanos e a Fundação Nacional do Índio (Funai). “Os fatos narrados apresentam um quadro de violações sistemáticas aos direitos fundamentais do povo Yanomami”, ressaltam. A representação é assinada pelo atual e pelo futuro líder do partido na Câmara: os deputados Reginaldo Lopes (MG) e Zeca Dirceu (PR), respectivamente.
Segundo a ação, a “política de extermínio dos povos Yanomami e de outras comunidades indígenas” foi conduzida com “galhardia e prazer” pelo ex-presidente da República.
“A responsabilidade por essa tragédia é conhecida no Brasil e no mundo. Na verdade, além da omissão dolosa, o primeiro Representado [Bolsonaro] é diretamente responsável por autorizar, incentivar e proteger o garimpo ilegal nas terras indígenas Yanomami e em várias regiões da Amazônia. Essa política de Estado comandada diretamente pelo ex-mandatário da Nação e executada, também por ação e/ou omissão dolosa pela segunda representada [Damares] e outros atores integrantes do desgoverno encerrado em 31.12.22, contribuiu de maneira decisiva para a contaminação dos rios (mercúrio) e, consequentemente, resultou nos impactos na alimentação (pesca) e nas condições de sanitárias (saúde) dos povos tradicionais que vivem e sobrevivem nas áreas onde não deveria haver garimpos, legais ou ilegais”, diz trecho da ação.
Damares responde
Em suas redes sociais, Damares Alves divulgou uma nota respondendo às acusações. Confira a seguir:
“Acompanhei com dor e a tristeza as imagens que estão sendo divulgadas sobre os Yanomami. Minha luta pelos direitos e pela dignidade dos povos indígenas é o trabalho de uma vida. Mas diante de tantas mentiras espalhadas nos últimos dias, preciso esclarecer algumas coisas. No Governo Bolsonaro, a política indigenista era executada em três ministérios: Educação, Saúde e Justiça. Ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos cabia receber denúncias de violações de direitos dos indígenas e encaminhá-las às autoridades responsáveis.
O MMFDH esteve ‘in loco’ inúmeras vezes para levantar informações. No auge da pandemia distribuímos cestas básicas. Enviamos ofícios aos órgãos responsáveis para solicitar atuação e recebemos relatórios das equipes técnicas, as quais informaram as providências tomadas. O MMFDH, num grande esforço, e com o apoio de outros órgãos, entregou o Plano Nacional de Enfrentamento a Violência Contra Crianças, inclusive reconhecendo a desnutrição como uma das mais terríveis violências contra elas, propondo ações.
O Plano passou a ser executado priorizando três áreas indígenas e uma delas é a área Yanomami. SESAI e a FUNAI trabalharam muito no governo Bolsonaro, não houve omissão. A desnutrição entre crianças indígenas é um dilema histórico e foi agravada pelo isolamento imposto pela pandemia. Entre os anos 2007 e 2011, o Vale do Javari já tinha índices alarmantes.
A mesma imprensa que hoje faz cobertura positiva da agenda presidencial fez críticas à época. Tenho a convicção de que mais do que posar para fotos e realizar belos discursos (feitos a quilômetros das aldeias), devemos enfrentar a raiz do problema. Sempre questionei a política do isolamento imposta a algumas comunidades. Está na hora de uma discussão séria sobre isso. Ao invés de perdermos tempo nessa guerra de narrativas e revanchismo, proponho um pacto por todas as crianças do Brasil, de todas as etnias.”