* Por Josival Pereira
A imprensa paraibana voltou a noticiar sobre movimentação do ex-governador Ricardo Coutinho (PT) em Brasília, onde teria fixado residência visando ocupar um bom cargo no futuro governo Lula. Especula-se até sobre ministério. Amigos de Ricardo confirmam parte das informações, mas dão outra versão para a mudança de domicílio.
O ex-governador paraibano pode até estar tentando ocupar um cargo de importância, mas, em relação à mudança de domicílio, um amigo com relação bem próxima a Ricardo nos últimos meses, garante que a razão é que o ex-governador se sente perseguido na Paraíba. Se sente profundamente perseguido. O político mais perseguido. Se sente injustiçado. Perseguido e injustiçado. Seriam esses os sentimentos que o dominam e, por isso, preferiu, pelo menos momentaneamente, respirar outros ares. Buscar paz com a família.
Não se duvida que, efetivamente, o ex-governador Ricardo Coutinho se sinta perseguido e injustiçado. O problema, porém, talvez seja identificar quem o persegue ou o perseguiu, gerando a injustiça da qual ele se sente vítima.
Na política, não existem forças que reúnam condições de ter perseguido Ricardo em algum momento da história recente da Paraíba.
O ex-governador Cássio Cunha Lima (PSDB), a quem Ricardo triturou politicamente quando era governador, talvez até tivesse razão para querer desconstruí-lo . Mas há muito Cássio não tem poder nem força política. O único espaço de poder que Cássio poderia exercer influência seria no Tribunal de Contas do Estado (TCE), que, a rigor, foi benevolente com o governador Ricardo Coutinho, reprovando suas contas sem responsabilização de improbidade e sem imputação de débito. Nem nos discursos Cássio conseguiu acossar Ricardo.
Não existe também evidência de que outra força política importante da Paraíba nos últimos anos, a liderada pelo ex-governador José Maranhão, tenha movido um dedo contra Ricardo. Na verdade, em vários momentos, Maranhão atuou para respaldar o poder de Ricardo.
Outra liderança política contra a qual Ricardo atuou para destruir foi o ex-prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo, que, como Maranhão, também fez foi ajudá-lo a se reeleger em 2014 e voltou a se aliar agora, em 2022. Além disso, Cartaxo não dispõe de instrumentos de poder para perseguir e destruir uma liderança do porte que Ricardo foi.
Na Assembleia, Ricardo sempre contou com a conivência e complacência dos deputados. Mesmo fora do governo e derrotado nas urnas, os parlamentares ainda protegem o ex-governador, não votando suas contas reprovadas pelo Tribunal de Contas.
Na Justiça Eleitoral, Ricardo foi poupado com a lentidão na análise de ações contra ele e, ao final, com decisões que o livraram da cassação e da imputação de inelegibilidade, o que só ocorreu no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde, com certeza, não houve interferência da política da Paraíba, carente de prestígio em Brasília.
Na Justiça, Ricardo passou incólume. Ainda agora não existe uma condenação contra ele. Na verdade, correm nos bastidores do poder na Paraíba listas de apadrinhados de figuras importantes do Judiciário que ocupavam cargos na gestão de Ricardo. Muitos cargos. Até agora, Ricardo não pode atribuir qualquer perseguição à Justiça da Paraíba.
Resta a investigação do Ministério Público, através do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), na chamada Operação Calvário. Existem denúncias fortes, prisões, incluindo a detenção do próprio Ricardo. Mas há de se perguntar: se trata de uma investigação ou de perseguição pura e simples? Pelo que se sabe, trata-se de uma investigação da qual o Ministério Público não poderia se ausentar e não de uma acusação sem sentido.
Além disso, é preciso se registrar que no Brasil vários políticos são investigados, denunciados, algumas vezes condenados, e, ainda assim, se mantêm vivos, se elegendo e se reelegendo anos a fio. Se Ricardo se destroçou politicamente foi por causa de suas próprias fragilidades.
Registre-se ainda que o maior problema de Ricardo talvez tenha sido a forma autoritária como exerceu o poder e o pragmatismo político abusivo, usando e descartando aliados os mais diversos. Talvez não tenha atentado para os ensinamentos da Regra Três, do poeta Vinicius de Moraes: (…) tantas você fez que ela cansou (…) e (…) há sempre um dia em que a casa cai (…).
Com todo respeito em relação a sentimentos, mas esse do que Ricardo se sente vítima talvez seja o de Ubaldo, personagem paranoico do Henfil, que, na ditadura, viu perseguição em tudo. A paranoia de Ricardo não tem nada a ver com ditadura: parece ser o vazio de quem não soube usar e não se acostuma a viver sem o poder.