O presidente Jair Bolsonaro repetiu sua tese nunca comprovada de que o sistema eleitoral brasileiro é passível de fraudes na reunião com embaixadores estrangeiros na tarde desta segunda-feira, 18, no Palácio da Alvorada. O Estadão contabilizou ao menos 70 diplomatas. No encontro, ele citou vídeos descontextualizados e versões já refutadas pela Justiça Eleitoral.
“Eu sou acusado o tempo todo de querer dar o golpe, mas estou questionando antes porque temos tempo ainda de resolver esse problema”, afirmou o presidente a embaixadores ao apresentar um PowerPoint com suas desconfianças e ataques a ministros do STF.
Bolsonaro voltou a apresentar uma versão distorcida de inquérito da Polícia Federal para sustentar o discurso de por em dúvida o processo eleitoral. Segundo ele, hackers ficaram por oito meses dentro dos computadores do TSE e tiveram acesso a uma senha de um ministro da Corte. “Eu sou presidente da República e fico envergonhado de falar isso aqui”. A corte eleitoral já se manifestou sobre o caso atestando que a investigação não concluiu por fraude nas eleições de 2018, como sustentou de novo hoje Bolsonaro.
Como lembra esta matéria originalmente publicada pelo Estadão, a Polícia Federal, já no ano passado, negou que as urnas eletrônicas tenham sido alvo de investigações da corporações relativas a fraudes, desde que o sistema eletrônico foi implementado no Brasil, em 1996. Em resposta às investidas de Bolsonaro, o TSE também divulgou uma lista de fatos para contrapor as 20 alegações contadas pelo presidente sobre o processo eleitoral. Entre elas a que um hacker teve acesso a todas as informações internas da Corte.
Aos embaixadores, Bolsonaro alegou que tudo o que apresenta está documentado. Mas apresentou apenas um compilado de declarações de ministros e trechos fora do contexto da apuração da PF. “O que eu mais quero por ocasião das eleições é a transparência. Queremos que o ganhador das eleições seja aquele que foi votado”. O PowerPoint tinha um título com erro de ortografia em inglês. Ao invés de briefing, estava grafado “brienfing”. A falha foi ironizada na internet.
O presidente argumentou que apenas dois países do mundo usam o sistema eleitoral semelhante ao brasileiro, o que não é verdadeiro. Segundo informou o TSE, o Instituto Internacional para a Democracia e a Assistência Social (IDEA Internacional) mapearam 23 países que usam urnas com tecnologia eletrônica para eleições gerais. Outros 18 adotam o modelo em eleições regionais. “Entre os países estão o Canadá, a Índia e a França, além dos Estados Unidos, que têm urnas eletrônicas em alguns estados”, informou o TSE.
No encontro, Bolsonaro falou num suposto risco de instabilidade no País respaldados por suas teorias. “Sei que os senhores querem estabilidade democrática e ela só será conseguida com eleições transparentes”, afirmou. “Queremos corrigir falhas, transparências, queremos democracia de verdade”, acrescentou.
Aos presentes, Bolsonaro alegou que a desconfiança dos brasileiros com o sistema eleitoral tem se avolumado. “Sistema eleitoral é completamente vulnerável”, declarou. Na verdade, as pesquisas indicam que a maioria da população confia nas urnas eletrônicas. Em maio deste ano, o DataFolha mostrou que 73% dos brasileiros apoiam o uso da urna do TSE nas eleições.
Em seguida, saiu em defesa das propostas das Forças Armadas para as eleições, já negadas pelo Tribunal Superior Eleitoral. “Estancam possibilidade de manipulação de números”, justificou o chefe do Executivo, que lembrou ter proposto o voto impresso para o Congresso. O projeto foi rejeitado pelo Congresso Nacional.
Na apresentação, o presidente citou nominalmente os ministros do TSE Edson Fachin, atual presidente da Corte, e Alexandre de Moraes, que assume o cargo em agosto. O ex-presidente do tribunal, Luis Roberto Barroso também foi atacado por Bolsonaro. Segundo Bolsonaro, Fachin garantiu o direito do petista Luiz Inácio Lula da Silva de disputar as eleições porque quer elegê-lo. Na verdade, o petista teve processos anulados pelo Supremo Tribunal Federal, passando a ter condições de disputar uma eleição.
Bolsonaro chegou a exibir trecho de um vídeo com voto do ministro Alexandre de Moraes avisando que não toleraria ataques às urnas nas eleições deste ano e que os políticos correriam o risco de serem cassados e até mesmo presos. O presidente lembrou que Barroso foi advogado do terrorista Cesare Battisti.
O presidente voltou a citar vídeos que circularam durante o dia de votação em 2018 cujas denúncias de falha nas urnas nunca foram comprovados. Bolsonaro contou que eleitores relatavam apertar 17 na urna eletrônica, mas aparecia o 13 do PT. O deputado estadual do Paraná Fernando Francischini (União Brasil-PR) foi condenado por divulgar essas mesmas informações falsas sobre as urnas naquele ano. A condenação chegou a ser suspensa por liminar do ministro Nunes Marques, indicado por Bolsonaro para o Supremo Tribunal Federal. Mas a Segunda Turma do STF derrubou a decisão, mantendo a cassação do deputado bolsonarista.
Ao final da exposição, não houve aplausos. Os embaixadores saíram em silêncio. Um grupo, porém, pediu para tirar foto com o presidente.