Um conflito agrário que perdurava desde 2010 no assentamento Xique-Xique, localizado nos municípios de Monteiro e Camalaú, na região do Cariri paraibano, teve fim esta semana com a realização de duas audiências de conciliação, dias 20 e 21 de junho, na 11ª Vara da Justiça Federal no estado.
A ação de desapropriação do imóvel rural denominado Moconha – originariamente pertencente à Tamoyo Frigoríficos Reunidos S/A e que permitiu a criação de assentamento pelo Incra em 2010 – era questionada pelos antigos proprietários, que alegavam a produtividade da área e a impossibilidade da obtenção para reforma agrária. Na área, com 1.872 hectares, atualmente vivem e produzem 40 famílias de agricultores familiares.
Ao final das duas sessões de conciliação, a ação de desapropriação foi julgada improcedente e ficou definido que o imóvel terá uma desapropriação indireta. O valor atualizado a ser destinado aos herdeiros do proprietário será apresentado pelo Incra. Com a decisão será efetuada transferência definitiva da propriedade sub judice para o instituto.
“O acordo pacífico traz segurança jurídica para as famílias assentadas, remanescendo apenas uma discussão quanto aos valores que serão pagos pela desapropriação”, explicou o juiz federal Fernando Porto.
As audiências foram acompanhadas por representantes da Câmara de Conciliação Agrária e da superintendência regional do Incra, do Ministério Público Federal (MPF), da Defensoria Pública da União (DPU), da Advocacia-Geral da União (AGU), da Prefeitura de Monteiro, das famílias assentadas e dos proprietários da terra.
Inspeção
Antes das audiências, os representantes citados participaram de uma inspeção judicial, realizada no imóvel rural, na última segunda-feira (20). A visita teve como objetivo, segundo o magistrado, “realizar tratativas para resolução definitiva da insegurança quanto à posse do território”.
Na oportunidade, foram vistoriados as edificações construídas, as condições das antigas benfeitorias, bem como as plantações de milho, palma e outras culturas, além das áreas para criação de animais, como alevinos e caprinos. As famílias assentadas em Xique-xique falaram sobre as atividades produtivas desenvolvidas no assentamento.
O diretor da Câmara de Conciliação Agrária do Incra, João Pedro Ribeiro Sampaio de Arruda Câmara, ressaltou a importância da resolução de um conflito que durava mais de uma década e era motivo de angústia para todas as partes envolvidas.
“Para a viúva e herdeiros do desapropriado, o pedido formal de desculpas pelo erro da desapropriação de uma terra produtiva e a autorização para levantamento da parcela incontroversa da indenização. Para as famílias assentadas, a certeza de permanência nas terras que receberam do Programa Nacional de Reforma Agrária, de onde tiram seu sustento e garantem sua dignidade. ‘A noção de Estado de Direito reclama a de Estado responsável’”, concluiu João Pedro Câmara.
Segurança jurídica
Na avaliação do Judiciário, o encontro com todas as partes interessadas no processo de desapropriação foi essencial para a solução do conflito.
“A aplicação da justiça consensual possibilitou a resolução de causa complexa, já que se estava diante de um caso que existia da defesa da ordem jurídica, economicidade e ordem social”, afirmou a procuradora da República Janaína Andrade, que representou o MPF na inspeção judicial e nas duas sessões de audiência de conciliação desta semana.
“Reputamos de extrema importância o acordo, diante do impacto social que poderia ocorrer, já que pessoas que lá vivem, produzindo alimentos e criando animais, poderiam ser deslocadas para outras áreas, alterando o modo tradicional de vida destas famílias, que poderiam ir para periferias urbanas, como demonstram outros casos que não tiveram conciliação em conflitos agrários. Com a conciliação, os assentados terão segurança para investir nas suas terras, produzir mais e ter independência econômica”, acrescentou a procuradora da República Janaína Andrade, ressaltando que as famílias do assentamento Xique-Xique investiram recursos próprios e públicos, também por meio de financiamentos agrícolas, para se manterem com independência produtiva.