O Ministério Público da Paraíba (MPPB) instaurou procedimentos para apurar denúncias de irregularidades praticadas por conselheiros tutelares da Capital, em relação ao acúmulo ilegal de cargos e ao afastamento, sem previsão legal, para o exercício de função comissionada na Prefeitura de João Pessoa.
O problema também trouxe à tona a preocupação de órgãos e instituições que integram a rede de proteção à criança e ao adolescente em relação ao Projeto de Lei (PL) de autoria do vereador Ives Rocha Leitão (conhecido como Mikika Leitão) que visa alterar o artigo 48 da Lei Municipal 11.407/2008, em tramitação na Câmara de Vereadores.
Se aprovado, conselheiros tutelares, mesmo não tendo vínculo empregatício com o Município de João Pessoa, poderão se afastar do exercício de suas atividades para exercerem cargos ou funções, de qualquer natureza, perante órgãos das esferas dos poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e permanecer recebendo os vencimentos de conselheiro tutelar na hipótese de optarem por essa remuneração.
Além de impactos financeiros, o MPPB e órgãos que integram a rede de proteção acreditam que a medida pode enfraquecer o papel do Conselho Tutelar na proteção de crianças e adolescentes, pois poderá ser encarado, por alguns, como “trampolim” para cargos comissionados no poder Executivo.
Essa possibilidade acarretará prejuízo e despesas extras ao Município porque o poder executivo municipal terá que arcar com os custos do conselheiro tutelar afastado e do suplente convocado para seu lugar.
“Fui procurado por integrantes da rede de proteção aos direitos de crianças e adolescentes que estão extremamente preocupados com esse projeto de lei. O projeto cria despesas para o Município num momento tão delicado e difícil que atinge toda nossa sociedade, onde os recursos municipais estão sendo destinados principalmente para o enfretamento da pademia da covid-19. O PL possibilita, ainda, o afastamento do conselheiro tutelar para cuidar de interesse pessoal pelo prazo de 180 dias sem prejuízo de continuar a receber sua remuneração”, esclareceu o 31º promotor de Justiça da Capital, Alley Escorel, que atua na defesa da criança e do adolescente.
O representante do MPPB disse que o projeto cria despesas para o Município e adentra em matéria de competência do prefeito. “O PL possui vício de origem e teria que ter sido de iniciativa do poder Executivo, razão pela qual acredito que os vereadores farão a devida análise desses aspectos em plenário, principalmente no momento em que a sociedade exige que todos os agentes públicos direcionem esforços e os recursos para o enfrentamento da pandemia”, explicou.
Investigações
O MPPB tem atuado para garantir o cumprimento da Lei Municipal 11.407/2008, sobretudo do artigo 48 e do artigo 20 da Resolução 170/2014, que versam sobre a exclusividade para o exercício da atividade de conselheiro tutelar.
Recentemente, foi instaurada pela Promotoria de Justiça notícia de fato para apurar denúncia enviada à Ouvidoria do MPPB de que um conselheiro tutelar da região Mangabeira (zona sul da capital) se afastou da função para assumir cargo comissionado na diretoria de paisagismo na Prefeitura Municipal de João Pessoa. Um ofício já foi expedido para que o conselheiro tutelar apresente esclarecimentos sobre o fato.
Também foi instaurado procedimento para averiguar nova denúncia contra um conselheiro da região Praia que já foi alvo de investigação da Promotoria em 2019 por acúmulo ilegal de cargos. Na ocasião, o promotor de Justiça Alley Escorel expediu recomendação para que o conselheiro regularizasse sua situação e optasse por um dos cargos. Como ele se desligou da função que exercia em um hospital público, permanecendo no cargo de conselheiro tutelar com dedicação exclusiva, o procedimento foi arquivado. Com a nova reclamação de que ele voltou a acumular cargos este ano, novo procedimento foi instaurado.
Ainda em 2019, a 1ª Vara da Infância e Juventude de João Pessoa atendeu ao pedido liminar requerido em ações civis públicas ajuizadas pela Promotoria de Justiça e determinou o afastamento de dois conselheiros do Conselho Tutelar Região Mangabeira, por acúmulo ilegal de cargos. As vagas foram ocupadas pelos respectivos suplentes.
Conforme explicou o promotor de Justiça, Alley Escorel, além de ilegais, essas situações comprometem o bom funcionamento do Conselho Tutelar, órgão considerado a “porta de entrada” do sistema de garantia dos direitos de crianças e adolescentes.