O empreendedorismo no Brasil parece se fortalecer por conta do desemprego e da falta de oportunidade em algumas áreas de trabalho. Neste contexto, o empreendedorismo feminino tem crescido e se apresenta como uma importante ferramenta para diminuir a desigualdade entre os gêneros. Segundo Maria Clara Magalhães, jovem empreendedora e uma das integrantes da Be. Labs Aceleradora, o empreendedorismo feminino é um campo que traz benefícios, mas ainda é um caminho muito difícil para as mulheres. “O mercado de trabalho brasileiro mostra que as mulheres ainda têm um longo caminho a percorrer para obter o mesmo reconhecimento que os homens. Elas ganham menos que os colegas do sexo oposto em todos os cargos, áreas de atuação e níveis de escolaridade – a diferença salarial chega a quase 53%.”, explica.
Esta realidade faz com que muitas mulheres se sintam desestimuladas a abrir seus próprios negócios ou acreditar que são capazes de fazer a diferença. De acordo com Maria Clara, a saída para esse problema é promover alternativas para auxiliar essas mulheres no mundo dos negócios. “É preciso estimular essas mulheres. Mulheres que estão empreendendo, realizando seus sonhos e desejos, adquirem um conhecimento importantíssimo para vida pessoal e profissional. Também conseguem adquirir um novo mindset empreendedor, e querem resolver o problema das pessoas ao seu redor. Se empoderam e empoderam outras mulheres a quebrarem as barreiras de gênero”, destaca.
A Be.Labs aceleradora, empresa da qual Maria Clara faz parte, busca atender às empresas que tenham pelo menos uma mulher em cargo de direção, empresas lideradas por mulheres com um propósito, mulheres com uma ideia e que querem iniciar uma jornada no empreendedorismo, empresas estagnadas que querem turbinar os negócios e empresas tradicionais ou digitais que precisam se estruturar para melhorar a performance. “Buscamos acelerar um futuro sem diferenças. Queremos desenvolver o empoderamento feminino por meio do empreendedorismo e diminuir o sexismo que tanto prejudica as mulheres”, acrescenta a jovem empreendedora. A aceleradora conta com mais dois integrantes, Marcela e Christian Fujiy.
Em entrevista, Maria Clara Magalhães falou um pouco mais sobre empoderamento, o papel das aceleradoras, o ciclo do empreendedorismo feminino e as vantagens de estimular impactos positivos que gerem resultados para as empresas formadas por mulheres.
Como você vê o cenário do empreendedorismo feminino no Brasil?
São muitas as manchetes que o empreendedorismo feminino no Brasil está crescendo. Mas, a realidade não é fácil. Tendo muitas começado a empreender por necessidade, a maior parte atua como MEI ou como sócias de micro e pequenas empresas. 13% dos empreendedores são mulheres. Na pesquisa da Associação Brasileira de Startups (ABStarups) aponta que 74% das equipes de startups são formadas por homens e quase 90% das empresas de inovação e base tecnológica são comandadas por eles.
As pessoas desacreditam da capacidade da mulher de fazer negócio. Acho que isso vem de um abuso de poder. E também da falta de representatividade. A gente tem que desconstruir, batalhar por eficiência, profissionalismo e não ser um objeto sexual. As mulheres têm que abraçar essa nova era e crescer também como empresas, indo além dos estereótipos criados ao longo das outras gerações, para criar um ecossistema empreendedor mais equilibrado.
O que te levou a ser uma empreendedora?
Eu sou empreendedora desde sempre. Um pouco ousado né? Mas, pela minha visão de empreendedorismo, eu comecei a empreender desde o jardim de infância. Eu simplesmente não me encaixava no perfil de funcionária. Então, desde cedo, procurei alguma oportunidade para empreender, mesmo sem entender o significado da palavra, dava um jeito de colocar para fora esse desejo. Fui presidente de turma inúmeras vezes. Quase sempre era a líder dos projetos, das feiras de ciência, da turma da dança. Participei de vários grêmios estudantis e sempre fui a aluna “ativista”. Na universidade, eu assumi vários cargos de liderança e o último deles foi ser a presidente do Ramo Estudantil IEEE UFCG. Quando conheci Marcela e Chris, com toda a experiência de mercado e de vida deles, reconheceram isso em mim. O nome empreendedora ganhou si, então, significado e não encontro outra maneira melhor de me definir.
Como você chegou até a Be.Labs Aceleradora?
Costumo dizer que o universo sempre atrai as pessoas certas, na hora certa e do jeito certo. Não seria diferente com a Be.Labs. Os meus atuais sócios são tios do meu namorado. Os conheci quando havia acabado de ingressar na universidade e sempre rolou uma admiração mútua muito grande. Fui passar uma temporada na Ásia e eles tiveram a ideia da aceleradora. Entraram em contato comigo e eu comprei a ideia. Mesmo com o fuso de 12 horas começamos a trabalhar freneticamente para que este projeto saísse do papel e agora estamos aqui.
Qual é o objetivo da Be.Labs?
A Be.Labs é uma aceleradora para mulheres empreendedoras. As aceleradoras são empresas que tem, como principal objetivo, apoiar e investir no desenvolvimento e rápido crescimento de empresas, auxiliando-as a obter novas rodadas de investimento ou a atingir seu ponto de equilíbrio – quando elas conseguem pagar suas próprias contas com as receitas do negócio. Sentimos que essa é a forma que estamos contribuindo para um mundo melhor, mais justo e muito mais bacana de se viver. No Brasil, o racismo e o sexismo que estruturam os padrões de desigualdade social vulnerabilizam as condições de vida das mulheres.
Nós da Be.Labs queremos contribuir com esse desenvolvimento trabalhando o empoderamento feminino através do empreendedorismo. Nós acreditamos que a mulher é uma empreendedora. Dessa maneira, nós aceleramos um futuro sem diferenças. Nosso objetivo é lançar milhares de exemplos concretos, convincentes e inspiradores de mulheres ajudando mulheres no Brasil a nos lembrar de tudo o que temos para reformular, redefinir e recriar esse mundo.
Qual a realidade das mulheres no mercado de trabalho e no gerenciamento dos seus próprios negócios?
Um dado bem relevante é que o Brasil ocupa a posição 90° no ranking de igualdade de gênero segundo o Fórum Econômico Mundial. O mercado de trabalho brasileiro mostra que as mulheres ainda têm um longo caminho a percorrer para obter o mesmo reconhecimento que os homens. Pesquisa realizada pelo site de empregos Catho neste ano com quase 8 mil profissionais mostra que elas ganham menos que os colegas do sexo oposto em todos os cargos, áreas de atuação e níveis de escolaridade pesquisados – a diferença salarial chega a quase 53%.
Estudo divulgado no ano passado pelo Fórum Econômico Mundial indicou que serão necessários 217 anos para que mulheres tenham o mesmo salário que os homens. No Brasil, segundo os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua Trimestral, mulheres ganham, em média, 75,4% do que os homens ganham. O número é do quarto trimestre do ano passado. Em 2012, quando a pesquisa começou, essa proporção era um pouco pior, de 74,1%.
O que pode ser modificado para que o mundo dos negócios seja um ambiente mais saudável e igualitário para as mulheres?
A nossa única arma é o conhecimento. Mulheres e homens precisam entender os preconceitos que estão invisíveis aos nossos olhos. Com conhecimento percebe-se o que é violência contra mulher, sexismo e misoginia. Temos que aprender a reaprender e ter uma cabeça aberta às mudanças que estão acontecendo. Sobretudo, precisamos escutar, porque por muito tempo as mulheres foram silenciadas. Por que não dar uma chance às nossas ideias? Precisamos mudar uma cultura onde o homem ainda é dominante.
O empoderamento é importante para o avanço profissional e pessoal das mulheres?
Eu acredito no empoderamento através do empreendedorismo. Porque é o empreendedorismo é uma jornada de autoconhecimento. Então temos uma transição que começa pela mudança de consciência que vem do conhecimento. Quando uma pessoa tem consciência do seu empoderamento, ela assume com autonomia o rumo da sua vida e constrói iniciativas que mudem a realidade para melhor.
Algo mais a acrescentar?
Além do empreendedorismo feminino, acredito que precisamos falar do empreendedorismo jovem. A maioria dos meu colegas de universidade tem medo desse mundo e a minha geração é a que menos empreende, apesar de sermos a geração hiperconectada. Podemos aproveitar dessa nossa ligação com a tecnologia e trabalhar com o empreendedorismo de impacto social.
Nós já somos a mão de obra do país e porque não arregaçar as mangas para fazer pequenas e até grandes mudanças na nossa comunidade e na nossa realidade? Nós precisamos dessa motivação para sermos não só empreendedores, mas agentes transformadores.