“A Paraíba é uma tábua de pirulitos e não tem quem saiba quantos poços existem no Estado”. Quem afirma é o presidente da Agência Executiva de Gestão das Águas da Paraíba (Aesa-PB), João Fernandes, sobre a escavação de poços artesianos em terras paraibanas. A constatação tem relação com a morte de um trabalhador, no último final de semana, no município de Mamanguape, Litoral Norte da Paraíba, a 60 quilômetros da Capital, enquanto cavava um poço, informa reportagem da jornalista Lucilene Meireles, do Jornal Correio.
Segundo ele, para iniciar a obra, é necessário que seja emitido um documento de uso e ocupação, que seria de competência do município. Além disso, o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea-PB) teria que fiscalizar, já que trata-se de uma obra de engenharia. Por fim, a Aesa fiscaliza, quando tem conhecimento, por se tratar de obra hídrica. “Na maioria das vezes, a Aesa não tem conhecimento dos poços que estão sendo perfurados. Infelizmente, o público e o privado na Paraíba, em regra, não pedem licença para fazer obra hídrica”, afirmou.
A liberação para a perfuração de um poço artesiano depende de uma licença da Aesa, Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) do Crea e licença da prefeitura. Conforme o presidente da Aesa, é dever do município cuidar do uso e ocupação do solo. “Na bacia arenosa, de zona da mata, de litoral, tem que ter projeto de um geólogo. Nós analisamos e depois o proprietário pega a outorga para usar aquela água. A Aesa precisa controlar a obra, principalmente na bacia sedimentada. Se for no Semiárido, na rocha cristalina, não somos tão rigorosos, mas ainda assim temos que acompanhar”, destacou.
Nas fiscalizações, a Aesa notifica o proprietário e dá um prazo para regularizar. Caso isso não ocorra, a Aesa pode multar ou até fechar o poço. “Não pode usar recurso sem a outorga ou autorização”, ressaltou João Fernandes.
Escavados a esmo. O chefe de Fiscalização da Secretaria de Meio Ambiente de João Pessoa (Semam), Allison Cavalcanti, disse que a Prefeitura de João Pessoa não fiscaliza a escavação de poços. “Existe a Aesa que tanto autoriza quanto fiscaliza. Existem parâmetros que são os aceitáveis para que um poço seja cavado e quem analisa o projeto e analisa é a Aesa. A única forma que nós temos de análise, quando chega algum empreendimento que explica ou informa que tem poço, seja na construção ou estabelecimento comercial, pedimos uma outorga emitida pela Aesa”, explicou.
Ele ressaltou que a Semam não libera o licenciamento quando se trata de estabelecimento comercial e/ou edificações. Em reunião recente envolvendo vários órgãos, entre eles, a Aesa, o assunto foi discutido. “Muitos dos poços estão sendo cavados a esmo, sem acompanhamento técnico o que termina refletindo na aquisição de água de baixa qualidade ou até contaminada. No caso de prédios, água de poço é fantástico, sai limpinha, mas pode estar contaminada. Tem que construir uma estação de tratamento. Quem tem água de poço, deve estar atento que precisa ser feita a análise, seja ele autorizado ou não pela Aesa. Do contrário, pode causar problemas de saúde”, alertou.
Prefeitura quer mudanças na lei
A Prefeitura de Mamanguape vai estabelecer uma legislação municipal para melhorar a fiscalização na perfuração de poços. O secretário de Meio Ambiente, Defesa Civil e Recursos Hídricos da cidade, Gemerson Roque, afirmou que a decisão foi tomada após o acidente do último final de semana. A reunião para discutir o assunto está marcada para a próxima quarta-feira (21).
O secretário acrescentou que a perfuração de poços deve ser feita após outorga da Aesa. “Quem fiscaliza a construção é o Crea, mas percebemos que não existe essa fiscalização”, disse.
Ele completou que essa realidade não é apenas de Mamanguape. “Em outras regiões onde há falta d’água ou o abastecimento é insuficiente, é comum cavar poços. Há cerca de cinco anos, um trabalhador morreu num poço de 30 metros aqui e o corpo nunca foi encontrado. Não tem que parar de cavar, mas trabalhar com segurança”, concluiu.
Controle de condomínios
O presidente da Aesa, João Fernandes, explica que os casos de condomínios que perfuram poços são contra a legislação. “Tem uma lei que diz que onde houver distribuição de água potável, tratada, não pode perfurar poço para usar para consumo humano. No caso dos condomínios está tudo errado, mas isso é uma tarefa do tamanho do mundo”.
Relembre
O acidente ocorreu no sábado, quando um trabalhador morreu enquanto perfurava um poço. A parede da obra se soltou sobre ele. O corpo só foi retirado na madrugada da segunda-feira pelo Corpo de Bombeiros. A vítima, Ronaldo César Duarte, tinha 31 anos.
Em janeiro de 2017, quatro homens morreram durante a escavação de um poço, na zona rural do município de Barra de São Miguel, Agreste do Estado. Na época, a suspeita do Corpo de Bombeiros foi de que teria faltado oxigênio dentro do poço que tinha cerca de 10 metros de profundidade. Na região, castigada pela seca, é comum a perfuração de poços para suprir as necessidades da população.