Após quatro derrotas presidenciais seguidas, o PSDB poderia ter na próxima eleição a melhor oportunidade de voltar ao Palácio do Planalto, dado o desgaste do PT e do impeachment de Dilma Rousseff. Mas, depois do turbilhão Lava Jato e o apoio ao desgastado governo Michel Temer, o partido chega para a disputa de 2018 com uma série de desafios pela frente.
De acordo com reportagem de Mariana Schreiber, da Folha, o pré-candidato do partido, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, se apresenta para a disputa com o trunfo de ter uma base forte no maior colégio eleitoral do país. Mas nas pesquisas, como as do instituto Datafolha, seu nome recebe apenas de 6% a 12% das intenções de voto, a depender do cenário. Na liderança, isolados, aparecem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o deputado federal Jair Bolsonaro (ainda no PSC, mas que migrará para o PSL).
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a afirmar que o PSDB pode apoiar outro candidato de centro que se mostre mais viável, caso Alckmin não decole.
Confira abaixo quais os principais desafios do PSDB para fazer o governador de São Paulo chegar ao Planalto.
1. Superar a baixa projeção nacional
Alckmin construiu sua carreira política em São Paulo, onde já foi eleito três vezes governador —em 2014, mostrou força ao vencer ainda no primeiro turno, com 57% dos votos.
Seu perfil sério tem funcionado com o eleitorado paulista, mas não conseguiu empolgar o nacional em 2006, sua primeira tentativa de chegar ao Planalto. Na ocasião, viu seus votos encolherem no segundo turno (de 39,9 milhões para 37,5 milhões), algo raro na política.
“Ele não é um mestre do carisma. O apelido picolé de chuchu não é de todo injusto com o vigor da figura dele”, afirma o cientista político Fábio Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Para o sociólogo Sérgio Abranches, o fato de ter uma base eleitoral forte em São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, somado ao apoio que o PSDB costuma ter na região Sul, dá a Alckmin chances de alcançar o patamar de 20% dos votos no primeiro turno, passando para a segunda etapa.
Ele acredita, no entanto, que o tucano teria bastante dificuldade em um eventual segundo turno, quando teria que conquistar votos em Minas Gerais, Rio de Janeiro e no Nordeste do país.
“O principal obstáculo que eu observo é político. Estamos em um momento em que os extremos estão tomando conta da cena, e o governador Geraldo ocupa o oposto disso, que é o equilíbrio, a tentativa de fazer algo mais voltado para a administração”, avalia o deputado tucano Pedro Cunha Lima (PB).
O parlamentar diz que Alckmin terá de buscar votos com propostas concretas para a região Nordeste. Um dos trunfos do governador de São Paulo, por exemplo, é ter cedido sem custos bombas e tubos da Sabesp para ajudar a combater a seca, lembra o parlamentar. A iniciativa atendeu à população dos Estados do Ceará, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte.
2. Unir a centro-direita
Para Maria Hermínia Tavares, professora de Ciências Políticas da USP, a principal dificuldade de Alckmin está em construir alianças e consolidar-se como principal candidato de centro.
“Ele não vai disputar votos à esquerda nem disputará votos à extrema-direita, que esses vão para o Bolsonaro. Então, o que mais pode atrapalhar sua candidatura é ter muitos competidores na sua raia, o centro e a centro-direita”, observa.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), são dois potenciais candidatos com perfil semelhante ao de Alckmin. Eles, no entanto, não parecem opções mais fortes —jamais disputaram uma eleição majoritária e tampouco são nomes com apelo popular.
“Esses nomes não são, obviamente, de partida mais viáveis que o Alckmin. O apelido picolé de chuchu acaba se aplicando a todos”, afirma Reis.
No entanto, outros concorrentes ainda podem surgir no caminho do tucano, ressalta o cientista político Fernando Abrucio, da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP). Além de Marina Silva, pré-candidata da Rede, Abrucio acredita que, caso Lula não possa concorrer, “outsiders” (nomes de fora política) vão se animar ainda mais a entrar na disputa, como o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa (que vem sendo sondado pelo PSB) e o apresentador de TV Luciano Huck.
“Para Alckmin, o melhor cenário é Lula sair candidato”, acredita.
As alianças também são essenciais para o tucano ampliar seu tempo de propaganda na TV. Seu partido lhe garante apenas 1 minuto e 20 segundos de cada bloco de 12 minutos e meio, que serão transmitidos a partir de 31 de agosto, duas vezes ao dia, nas terças, quintas e sábados, no caso dos candidatos presidenciais.
“Ele precisa ter cinco minutos de televisão para expor o que ele tem em São Paulo. Se tiver três minutos, perde a eleição”, avalia o deputado estadual Campos Machado (PTB), fervoroso aliado de Alckmin.
3. Vencer o fogo amigo
Secretário-geral nacional do PTB, Machado está à frente do “esquadrão 2018”, como batizou a iniciativa para mobilizar as bases do seu partido em apoio a Alckmin, principalmente no Nordeste.
O PTB foi o único partido até agora a anunciar apoio ao tucano na disputa ao planalto. Na sua leitura, o maior obstáculo para o tucano é próprio PSDB, um “partido desunido”.
Em outubro, o ex-governador paulista Alberto Goldman chegou a dizer em uma palestra que Alckmin “não é uma grande figura de expressão, não é uma liderança nacional, mas é o que se tem”, segundo o jornal Valor Econômico.
Em recente entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que o PSDB deve apoiar o candidato de centro que tenha uma “mensagem que pegue no povo” e pareça mais viável eleitoralmente, não necessariamente um tucano.
“O que o Fernando Henrique disse foi uma grande bobagem. Pesquisa é retrato do momento. Dou o exemplo do (João) Doria (prefeito de São Paulo). Tinha 1% na prévia e acabou se elegendo no primeiro turno. Por força de quem? Do governador (padrinho da candidatura)”, diz Machado.
“O Fernando Henrique faria muito mais se trabalhasse, corresse o país, defendendo o nome do Geraldo.”
4. Afastar riscos em sua base
Outro desafio para Alckmin é a incerteza sobre a sucessão em sua própria base. Para disputar o pleito presidencial, o tucano é obrigado a renunciar ao cargo no governo paulista até o início de abril. Em seu lugar assume o vice, Márcio França (PSB), que pretende usar os meses que terá no comando do Estado para se projetar e disputar a eleição para governador.
O problema é que o PSDB, há mais de vinte anos governando São Paulo, dificilmente abrirá mão de ter um candidato, que pode vir a ser o senador José Serra, o prefeito paulistano, João Doria, ou outra liderança do partido. Diante disso, França já anunciou a intenção de desalojar todos os tucanos das secretarias estaduais.
“Aqui em São Paulo estamos dissociando a candidatura Geraldo Alckmin à Presidência da candidatura a governador, porque o Márcio França vai ser candidato de qualquer jeito, ele está chamando tudo que é prefeito. E o PSDB não abre mão de candidatura. O problema vai ser conciliar o candidato do PSDB com o candidato Marcio França”, diz Campos Machado.
Em entrevista publicada pelo jornal Folha de S.Paulo neste domingo, França se mostrou fiel a Alckmin e compreensivo com o desejo do PSDB de também ter candidato ao governo. Deixa claro, porém, que seu partido mantém conversas com Joaquim Barbosa e que o apoio da sigla à candidatura presidencial tucana depende de “gestos” do PSDB, ou seja, apoio a candidatos do PSB nos estados.
“Se você tem uma candidatura à Presidência, tudo tem que servir a ela. Acho que muita gente, até do PSDB, pode não achar isso, pode achar que é mais importante São Paulo do que o Brasil”, disse França.
Para Alckmin, é importante ter controle sobre esse processo e, por isso, o governador terá que se dedicar nos próximos meses à articulação política dentro do PSDB e com outros partidos, acredita Abrucio.
“Com isso, ele ainda deve aparecer pouco para o eleitor nos próximos meses e vai chegar em abril provavelmente com os mesmos 8% (de intenção de voto) que tem hoje. É o cenário que cria a possibilidade de outros candidatos mais ao centro também colocarem as manguinhas de fora”, observa.
5. Descolar-se de Temer e da Lava Jato
Alckmin também terá pela frente como desafio dissociar sua candidatura do presidente Michel Temer (MDB), cujo governo é impopular, e do senador Aécio Neves (PSDB-MG).
Embora o governador não tenha embarcado com força no impeachment ou na defesa do presidente após a delação da JBS, o PSDB foi um forte apoiador do governo.
Já Aécio, ex-presidente a sigla, teve sua reputação fortemente atingida após ser grampeado solicitando R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista. Ele nega irregularidades, e diz ter sido um pedido de ordem pessoal.
Alckmin também foi alvo de denúncias da operação Lava Jato, mas ainda em grau muito menor que Aécio ou o senador José Serra, por exemplo. Após ser acusado de receber caixa dois da Odebrecht, no final de 2017 a mesma empreiteira e a Camargo Corrêa admitiram ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que formaram cartéis para vencer obras públicas em São Paulo durante seu governo.
Em relação às sua campanhas, o governador nega ter pedido recursos irregulares ou autorizado outras pessoas a fazê-lo em seu nome. Sobre o caso conhecido como “cartel do metrô”, diz.
“A Lava Jato está perdendo muito a força, mas ainda assim há um grau de incerteza, para várias pessoas, não só o Alckmin”, acredita Abrucio.