Os custos socioambientais para construir grandes hidrelétricas quase quadruplicou nos últimos 20 anos, segundo estudo do Instituto Acende Brasil. A participação dessas despesas no orçamento total dos projetos subiu de 5,7%, nos anos 1990, para 20%, entre 2010 e 2014.
Os gastos que mais cresceram foram relativos à compra de terrenos, à realocação de populações afetadas e à limpeza de reservatórios, relata a reportagem de Taís Hirata, da Folha.
Com a maior de pressão da sociedade civil, a fiscalização ficou mais rigorosa, o que elevou os custos, diz Alexandre Uhligm, diretor do instituto.
A alta também ocorre porque, no passado, essas despesas eram subdimensionadas nos orçamentos, afirma.
Os custos socioambientais têm peso muito maior nas hidrelétricas. Nas termelétricas, eles representam 1,9%. Em eólicas, a fatia é de 3%, e, em solares, 1%, aponta a EPE (estatal responsável pelo planejamento do setor de energia).
“O custo alto por si só, porém, não impede a construção das usinas. Ele é repassado para as tarifas e reflete o cuidado que a sociedade deve ter com o ambiente”, diz Uhlig.
Para o diretor, o maior entrave das hidrelétricas é a resistência de movimentos de defesa de povos indígenas, já que grande parte dos empreendimentos requer o alagamento de áreas demarcadas.
Com a maior dificuldade, o potencial para novas grandes usinas estaria próximo ao fim.
Dos 250 GW (gigawatt) de potencial de hidrelétricas no país, 100 GW já foram construídos e outros 100 GW dificilmente poderão ser aproveitados, por causa de dificuldades de licenciamento ambiental, segundo Uhlig.
Restariam 50 GW ainda passíveis de serem convertidos em hidrelétricas —o equivalente a 3,5 usinas de Itaipu.
ENERGIA SUBSTITUTA
O tema é alvo de fiscalização do TCU (Tribunal de Contas da União), que cobra do Ministério de Minas e Energia mais articulação com outros órgãos (como Funai e Ibama) no processo de licenciamento e maior planejamento técnico para lidar com o impacto de não construir hidrelétricas.
O temor é que, com o aumento de demanda por energia, sejam acionadas mais usinas térmicas caras e poluentes, afirma Manoel de Souza Neto, secretário do TCU.
“Não há articulação institucional. A usina de São Luiz do Tapajós [no Pará], por exemplo, foi vetada. São 8 GW a menos no sistema. Quantas térmicas são necessárias para suprir essa demanda, e a que custo?”
Em meio à paralisação de obras, é importante avaliar o que substituirá essas usinas, diz Uhlig.
Para Ricardo Baitelo, coordenador do Greenpeace, fontes limpas poderiam compensar essa demanda por energia no lugar das termelétricas a carvão.
“Há outras soluções. Se a escala das usinas solares e eólicas aumentar, a intermitência cai. Há também usinas movidas a biomassa, que são sustentáveis. Além disso, há formas de distribuir melhor o consumo de energia ao longo do dia.”
Quanto à pressão indígena, trata-se de defesa legítima de direitos, segundo Ciro Campos, da ONG Instituto Socioambiental.
“O governo federal inclusive tem contornado a resistência ‘na marra’, com uso da Força Nacional para entrar nos territórios”, diz ele.
Em resposta aos questionamentos do TCU, o Ministério de Minas e Energia afirma que não há falta de planejamento e que a expansão da matriz é pautada por “robustos estudos de engenharia”.
A pasta diz que está analisando os levantamentos do tribunal e que implantará as medidas possíveis. Segundo a nota do ministério, uma maior articulação entre diferentes órgãos dependeria de coordenação da Casa Civil –que, por sua vez, respondeu à reportagem dizendo que o tema deveria ser tratado com o MME.
A EPE diz que os órgãos trabalham para melhorar a estruturação dos projetos de hidrelétricas e que reconhece seus benefícios.
O órgão, responsável por elaborar os estudos técnicos que embasam o planejamento do ministério, também destaca que esse cenário de uma participação mais limitada de hidrelétricas na expansão do sistema já é previsto nos planos decenais, que hoje preveem um “mix de renováveis e térmicas” para garantir o abastecimento do país.