Fundador de um grupo que dará bolsas de R$ 5.000 a R$ 12 mil para interessados em disputar as eleições, o empresário Eduardo Mufarej, 41, costuma dizer que os brasileiros andam tão desconfiados da política que “veem sombra até sob o sol do meio-dia”.
Mesmo com a tal descrença no sistema e nas intenções do RenovaBR, a organização (autodefinida “aceleradora de potenciais talentos políticos”) recebeu cerca de 4.000 inscrições no processo que selecionará até 150 novas lideranças de todos os Estados para se prepararem para as urnas, revela matéria de Joelmir Tavares, da Folha.
Enquanto entrevistam um a um os interessados e organizam bancas de avaliação que definirão os participantes, os diretores do movimento se animam com a diversidade, buscada desde o anúncio da seleção, no mês passado.
Entre os 45% de inscritos que são filiados a partidos, há representantes desde o PSTU —sigla marxista do slogan “Contra burguês, vote 16″— até o PEN —que está mudando de nome para Patriota e deverá abrigar o presidenciável Jair Bolsonaro (hoje no PSC).
Das 35 legendas registradas hoje no país, só PCB e PCO não tiveram inscritos no processo. E os participantes que não são filiados indicaram intenção de entrarem também em variados partidos (PSOL, Rede, PT, PSDB, PMDB e DEM, por exemplo).
O RenovaBR quer priorizar postulantes ao Congresso Nacional e afasta a possibilidade de se envolver em disputas do Executivo, mas ficou conhecido pela relação com Luciano Huck, que nesta semana anunciou que não tentará o Planalto. O apresentador da Globo apoia a iniciativa e é um dos potenciais doadores.
“Ficar de braços cruzados não era uma opção”, diz Mufarej na sede da organização, em um prédio no Itaim Bibi (zona oeste). “Desqualificar as iniciativas e achar que têm um segundo interesse não ajuda em nada. Da mesma forma, deveríamos parar de ver com suspeição pessoas que querem se candidatar. Isso levou a esse quadro onde ninguém bom quer entrar para a política.”
Segundo o empresário, até agora só ele colocou dinheiro no RenovaBR. Sócio do fundo de investimento Tarpon, ele já afirmou que o projeto conta também com a simpatia (e as possíveis contribuições) do empresário Abilio Diniz e de outras figuras do mercado.
Os recursos serão aplicados nas bolsas —o plano é que, com elas, os potenciais candidatos possam se manter durante o período de formação sem precisar de um emprego— e nos cursos. As aulas, em São Paulo, incluirão noções de campanha e de ciência política, funcionamento do Estado e desafios urgentes do país.
EXTREMOS
A maioria (80%) dos interessados nunca concorreu em eleições. O movimento evita colocar meta para o número de selecionados porque vai estudar a viabilidade eleitoral deles. Quer impedir, por exemplo, que sejam aceitos dois candidatos com perfil semelhante que disputem o mesmo eleitorado numa região.
Serão priorizados nomes com potencial de votação e que já tenham um papel de liderança ou possuam base.
Também não estão estabelecidas, para a lista final, cotas de gênero ou etnia. Mas o grupo insiste que não abrirá mão da variedade de perfis.
O percentual de mulheres atraídas pela iniciativa ficou abaixo do esperado —elas são 15% do total de inscritos, embora o objetivo inicial fosse ter 30%. Psicóloga especializada em recrutamentos e cofundadora do RenovaBR, Izabella Mattar, 31 (que trabalhou com Mufarej na Tarpon), pondera: “Como o número total de inscritos superou a expectativa, que era de 1.200, acabamos com uma quantidade de mulheres acima do previsto”.
O grupo não divulga nomes dos inscritos, mas a Folha apurou que entre os interessados há um ex-ministro do governo federal e um dirigente nacional de um partido. Os futuros bolsistas, que devem ser anunciados em janeiro, vão se capacitar até junho.
“Surgiram extremos: gente que acha que a economia tem que estar 100% na mão do Estado e gente a favor de intervenção militar. Nenhum dos dois vai entrar”, diz Mufarej.
O RenovaBR, afirmam os fundadores, sairá de cena quando começar a campanha, para evitar acusações de interferência indevida e de descumprimento da proibição de doações de pessoas jurídicas.
Posições partidárias serão respeitadas, segundo o empresário, embora o grupo busque representantes mais ao centro e peça, por exemplo, que os eventualmente eleitos cumpram mandato até o fim. “A fidelidade da pessoa não terá que ser em relação ao Renova, mas à sua base”, diz ele.