A pouco menos de um ano das eleições, o PSDB lançou, na tarde desta terça-feira, um roteiro do que seria seu governo, caso vença o pleito presidencial de 2018. No texto, os tucanos falam de “fim dos privilégios” e citam como valores o “desenvolvimento econômico” e a “igualdade de oportunidades”, com “sensibilidade social”. Num capítulo exclusivamente dedicado a falar “contra os privilégios”, as diretrizes partidárias sugerem a revisão do acesso dos ricos a serviços públicos, informa reportagem de Catarina Alencastro, de O Globo.
“O capitalismo de compadrio tem que acabar. A concessão de subsídios, renúncias fiscais, desonerações e benefícios tributários requer regras amplamente debatidas com a sociedade, e isso vale para todo o orçamento público! Em particular, o acesso dos mais ricos a serviços públicos gratuitos precisa ser reavaliado.”
Embora não cite o atual governo, assolado por denúncias de corrupção, o documento — intitulado “Gente em primeiro lugar: O Brasil que queremos” — diz que o PSDB não irá tolerar a falta de ética. “A atividade pública não pode servir ao enriquecimento pessoal, mas somente ao bem comum. Não compactuaremos com a corrupção, a desonestidade, a falta de ética, os desmandos”, diz o texto.
O documento é lançado um dia depois que o partido resolveu tentar pacificar as rusgas internas com o aviso de que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, assumirá a dupla função de ser o candidato do partido à Presidência da República e o candidato único para presidir a legenda, a partir do mês que vem.
Formulado pelo Instituto Teotônio Vilela, o texto agradou parte dos deputados que ficaram conhecidos como cabeças pretas, que pregam há seis meses o rompimento com o governo. Embora apoiassem a candidatura à presidência do partido do senador Tasso Jereissatti, alguns veem com bons olhos o lançamento de hoje, já sob a notícia de que será Alckmin o novo presidente do partido. O texto ataca em diversos momentos a cultura dos privilégios e chega a chamar de “engrenagem perversa” o fato de alguns terem mais chances do que outros.
O próprio Tasso, no entanto, minimizou a importância do documento. O senador disse que as novas diretrizes do PSDB devem ser discutidas e definidas na convenção nacional de dezembro, junto com o novo estatuto e código de ética.
— Não conheço e nem me interesso em conhecer. Vai vir aí uma nova administração, um novo estatuto, um novo código de ética. Esse documento ficou velho, caducou — criticou Tasso.
Na área social, o texto cita programas implementados pelos dois governo de Fernando Henrique Cardoso, como o Bolsa Escola e o Saúde da Família. E pontua que o Estado deve ter um “ativo braço social” para dar condições dignas de vida aos mais pobres. Nesse sentido, o roteiro de um novo governo tucano condena “os danos” causados pela “malversação do dinheiro público”. E sugere que haja uma reforma tributária que taxe a renda e “salvaguarde” os mais pobres.
Os tucanos também defendem a redução do número de ministérios, cargos e órgãos para aumentar a qualidade da prestação dos serviços. E dizem que novas contratações públicas, só por meio de concursos, e quando necessárias.
No quesito segurança pública, o texto diz que cabe ao governo federal assumir a responsabilidade no combate à violência. Os tucanos sugerem que haja uma reforma no sistema prisional visando à reintegração dos presos à sociedade após serem soltos.
O PSDB também procura se diferenciar do governo peemedebista na questão ambiental. Para se contrapor às críticas ferrenhas dos ambientalistas à atual gestão, os tucanos dizem que combaterão o aquecimento global.
‘NÃO ADIANTA TROCAR O NOME’
O documento foi lançado em um evento no Salão Nobre da Câmara dos Deputados e não contou com a presença de Tasso Jereissatti. Já o senador Aécio Neves (MG), chegou atrasado, foi anunciado, e recebeu palmas de parte da platéia, que não chegou a ficar lotada. O presidente interino do PSDB, Alberto Goldman , ficou indignado com a declaração que Tasso deu minutos antes de a cerimônia começar, de que o documento do Instituto Teotônio Vilela ficou velho, caducou e ele nem se interessou em ler.
Goldman disse que o órgão de debate do partido se dedicou a preparar o documento , já que foi do próprio Tasso, na interinidade, a decisão de convocar um Congresso Nacional para o dia 08 de dezembro, para aprovar as novas diretrizes do PSDB.
— Como é? Não leu e não gostou? Ele quem mandou fazer para o Congresso determinado por ele. Deveria ter lido para opinar — reagiu Goldman.
Ao fim da cerimônia, ele defendeu a tese de rever a concessão de serviços públicos para os ricos.
— Como é que você dá gratuidade sobre muitos serviços públicos? Isso deve ser para todos ou para aqueles que não tem condições? Você deve dar hospital público aberto e gratuito para todos ou só para aqueles que de fato precisam disso? Isso vale para escolas e outros serviços públicos. Isso é uma tese a ser discutida, não é decisão do partido até agora — explicou.
Segundo José Aníbal, presidente do Instituto Teotônio Vilela, o fim dos privilégios será uma bandeira importante na campanha presidencial tucana, mas a principal será a da retomada do crescimento econômico.
— A principal meta é fazer a renda per capita dos brasileiros dobrar nos próximos 20 anos. País que tinha renda semelhante a nossa há 20, 30 anos atrás hoje tem o dobro ou mais. O Chile tem quase o dobro. O Brasil não pode mais viver como ioiô: acerta e desacerta, acerta e desacerta. Chega! A sociedade está enfadada disso aí — disse.
Na fase dos dicursos, o primeiro a falar foi o deputado Marcus Pestana (MG), que desferiu logo de cara uma crítica velada ao PMDB, que resolveu mudar de nome e voltar a se chamar MDB, prática que vem sendo adotada também por outros partidos.
— Vejo partidos mudando de nomes. Não adianta mudar o nome, não adianta operação cosmética. Tem que mudar as práticas — discursou Pestana.
Já o senador José Serra (SP) voltou a defender o parlamentarismo e lembrou uma fala da chanceler alemã Angela Merkel, segundo quem no parlamentarismo troca de poder é solução. No presidencialismo, é crise profunda.
Do grupo dos cabeças pretas, mais afinados com Tasso, apenas dois representantes estiveram no evento: o líder do partido na Câmara, Ricardo Tripoli (SP), que deixou o salão antes do fim dos discursos, e o deputado Betinho Gomes (PE), que preferiu minimizar o fato de Tasso ter faltado e já ter tecido críticas ao texto recém-lançado:
— É do clima.