O ministro da Saúde, Ricardo Barros, afirma que os planos de saúde “assumem um risco antecipado por uma coisa incerta” ao não poderem reajustar a mensalidade de usuários após os 60 anos. Um projeto que permite esse reajuste deve ser votado em comissão especial da Câmara nesta quarta-feira (8).
Em entrevista à Folha, Barros afirma que esse assunto, que é criticado por usuários e por entidades de defesa do consumidor, “tem que ser enfrentado”. “O equilíbrio econômico do plano de saúde tem que ser mantido”, diz.
Hoje, há dois tipos de reajuste de planos de saúde: um anual, que ocorre pela variação nos custos do período, e outro por faixa etária. O Estatuto do Idoso, porém, veta desde 2004 esta última elevação (relacionada à idade dos usuários) a partir dos 60 anos -há 6,2 milhões de clientes de planos acima dessa idade, informa reportagem de Natália Cancian, da Folha.
Pelo projeto em discussão na Câmara, esse aumento seria permitido. A justificativa é que, pelo modelo atual, há um único reajuste abusivo quando os usuários atingem 59 anos -e que ele poderia ser diluído em fases posteriores.
O ministro diz ainda que deve rever protocolos de alguns tratamentos para evitar que internações sejam prolongadas “sem necessidade”.
Folha – Como vê o projeto para alterar a lei dos planos de saúde que tramita com urgência no Congresso?
Ricardo Barros – Tem questões que precisam ser bem avaliadas pela repercussão que terão no sistema e que não quero entrar em detalhes. Mas, uma vez aprovado, ele vai trazer avanços.
Que avanços?
O projeto procura resolver problemas na área de ressarcimento ao SUS, na forma como os planos podem atuar no mercado, os reajustes nos planos individuais para a manutenção do equilíbrio econômico e financeiro das empresas.E nas multas aplicadas em valores significativos, mas que acabam não sendo recolhidas pela judicialização.
O sr. é favorável ao reajuste para idosos, como propõe o relator do projeto?
É outro ponto que está mal resolvido no atual formato. Como é proibido [hoje] aumentar o valor do pagamento do plano após os 60 anos, aos 59 anos todos recebem um reajuste de quase 100%, que visa diminuir o risco da empresa com essa pessoa que vai ficar um tempo, não se sabe se 20 ou 30 anos, sem poder ter reajuste na sua parcela. Mas também acaba por expulsar o usuário. É um assunto que tem que ser enfrentado.
A proposta de diluir esse reajuste, mexendo no Estatuto do Idoso, é positiva na sua visão?
Isso mantém o pressuposto de que aos 60 anos a empresa tem que definir todo o reajuste desse usuário até o final. De qualquer forma, mesmo que parcelado, é um risco muito antecipado que a empresa tem que assumir para uma coisa incerta. Não conheço profundamente a matéria de cálculo atuarial para saber se é a solução adequada ao problema.
Especialistas apontam riscos ao consumidor com esse reajuste, uma vez que depois dos 60 anos aumentam os custos de saúde e diminui a renda.
Estou tratando tecnicamente a matéria. Se queremos que o setor de saúde suplementar continue cooperando com o SUS e atendendo vidas que se autofinanciam no atendimento de saúde, e com isso aliviam a pressão sobre o SUS, é preciso que esse sistema se sustente. O equilíbrio econômico do plano de saúde tem que ser mantido.
O sr. sugeriu a criação de um plano de saúde popular, que teve um primeiro aval da ANS (Agência Nacional de Saúde). Como está essa discussão?
As empresas deverão ou não ofertar o que está autorizado no mercado.
Mas não dependeria de nova regulação da ANS para evitar risco ao consumidor?
A ANS já disse o que está dentro da regulação. Seria adequado fazer regulação própria? Eventualmente. Mas isso não está em voga agora.
A oferta de plano popular, com acesso a procedimentos mais simples, não pode fazer com que o SUS fique sobrecarregado sobretudo nos procedimentos complexos, que são mais caros?
O que uma pessoa tem direito no SUS? Tudo. Se ele em qualquer nível dessas necessidades financiar por conta própria, está aliviando o SUS. E os que só dependem do SUS terão mais rapidez de acesso.
Mas não há risco de fazer um usuário de plano de saúde trocar por um menor e ter essa sobrecarga?
Há. Mas também há risco de fazer muita gente que não paga nada entrar em planos menores e contribuírem para o sistema. A conta de arrecadação só pode aumentar. Clínica popular: é ruim ou bom para o SUS? É ótimo. Primeiro porque saiu da fila para a consulta. Segundo, porque se o médico da clínica popular identificar que ele tem uma doença, ele vai chegar mais rápido para tratarmos. Quanto custa uma consulta popular? De R$ 80 a 120. Com esse valor ele pode pagar um plano popular e ter uma cobertura.
O sr. está fazendo reformulação em vários programas do ministério, como o Farmácia Popular. Há outros que pretende rever?
Todos. Lipoaspiração é palavra de ordem. Tem que enxugar a gordura de tudo. Estamos fazendo análise de procedimentos, protocolos, portarias que estamos pagando e os hospitais não estão produzindo o que está pactuado. Eu pactuo um número de cirurgias, ele não faz e continua recebendo. Tenho protocolos que dizem que uma internação de hérnia é três dias.
Mas eventualmente pode fazer uma hérnia em um dia ou dois. Hoje, se o cara não ficar três dias internado, o hospital não recebe nada pela hérnia. Queremos flexibilizar porque não tem sentido. Fico ocupando um leito três dias com uma pessoa que poderia ter saído e dado lugar a outro.
O que deve mudar nessa parte de protocolos?
Vamos liberar esse negócio de no mínimo dois ou três dias de internação para que as novas tecnologias possam ser aplicadas em benefício do prestador de serviço. A pessoa não precisa ficar três dias forçosamente no hospital sem necessidade porque a regra manda. Vai ser uma ampla mudança para os hospitais.
A ideia é reduzir o tempo de internação?
Não. É adequar. Pode até ser aumentar também. É atualizar os protocolos dentro das novas tecnologias.
O sr. declarou em um evento que planejava rever o número de hospitais, que seria excessivo. Por quê?
Temos 150 milhões de pessoas que usam o SUS. Temos 6.000 hospitais [na rede pública] dos mais variados tamanhos. Minha conta era ter 1.500 hospitais com média de 100 leitos. São 150 mil leitos.
Então diminuiria de 6.000 para 1.500 hospitais?
Não necessariamente, porque falo em média de 100 leitos, mas tem hospitais de 30, 20. Hoje temos muito mais hospital pequeno do que grande. Mas isso [1.500 com esse porte] seria o ideal.
Vamos diminuir a permanência das pessoas, essas revisões todas de quantos dias fica internado. Todo nosso sistema é para desospitalizar. Quanto mais for eficiente a atenção básica, menos as pessoas vão internar. E menos leitos a gente precisa. A eficiência do sistema provocará a desospitalização e a necessidade de menos leitos. Mas o que estamos tratando agora é dessa eficiência do sistema.
Há uma meta de fechamento de leitos?
Não estou pensando em fechar leitos. Estou falando que, se tirar e pegar três hospitais de 30 leitos e fazer um de 100, está fazendo um grande negócio para a saúde, porque tem escala, tem segurança, tem mais resolutividade e capacidade. Se a pessoa complicar, tem UTI. O que precisamos é concentrar em serviços com resolutividade. Os hospitais de pequeno porte são caros porque fazem poucos procedimentos e são arriscados porque não têm recursos. Com 1.500 hospitais de 100 leitos, resolveríamos o problema. Mas uma parte não pode ser de 30 leitos? Pode. Então triplica. Temos taxa de ocupação de leitos que é muito baixa, abaixo de 40%. Isso só já denota excesso de oferta.
O sr. é um dos poucos que não defende um aumento de recursos para a saúde, enquanto todos apontam subfinanciamento. Mantém essa visão?
Não pediremos mais recursos para a saúde até termos certeza de que o que temos está bem gasto. E eu posso garantir que está mal gasto.
RAIO-X
NASCIMENTO
15 de novembro de 1959, em Maringá (PR)
FORMAÇÃO
Engenheiro civil pela Universidade Estadual de Maringá
CARGOS DE DESTAQUE
Prefeito de Maringá (1989-1992)
Deputado federal por cinco mandatos (1995 a 2011 e 2015 a 2019)
Tesoureiro do PP