Com mudanças favoráveis às empresas de transporte privado de passageiros, o Senado aprovou na noite desta terça-feira, 31, por 45 votos a 10, o texto-base do projeto que regulamenta empresas como Uber, Cabify e 99. Como a proposta sofreu alterações, terá de voltar para a Câmara dos Deputados, onde foi aprovada em abril, informa reportagem de Julia Lindner e Renan Truffi, do Estadão.
O projeto aprovado na Câmara era visto como favorável aos taxistas. Respeitando acordo firmado em reunião de líderes da Casa à tarde, os parlamentares retiraram, por meio da aprovação de duas emendas, a obrigatoriedade do uso de placas vermelhas e também a imposição de que apenas o dono do veículo pode dirigi-lo.
Foram retirados ainda outros dois trechos: um que possibilita a prefeitura regulamentar o serviço e também o trecho que restringia o veículo a circular só na cidade onde foi registrado.
O relator da proposta no plenário, senador Eduardo Lopes (PRB-RJ), disse que buscou uma mediação entre as empresas e os taxistas. “É muita pretensão querer que o plenário, composto por 81 senadores, viesse a aprovar sem nenhuma mudança, para que não voltasse para a Câmara”, defendeu.
Em conversas reservadas, governistas admitiam que o presidente Michel Temer não quer entrar em conflito com os taxistas nem com os responsáveis pelos aplicativos. Inicialmente, segundo aliados, o objetivo de Temer era deixar o projeto parado nas comissões da Casa.
Na semana passada, porém, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) acelerou a tramitação da proposta e evitou que ela tivesse de passar por outras cinco comissões, como previsto. Para isso, ele colocou em votação um requerimento de urgência do projeto para que ganhasse prioridade na pauta de votações do plenário.
A sessão no Congresso foi tensa, com manifestações das duas categorias para pressionar os parlamentares. Taxistas chegaram a levar trios elétricos para a Esplanada dos Ministérios.
O relações públicas do Uber, Fabio Sabba, chegou a ser atingido com um soco dentro do Senado, enquanto dava entrevista. Após a agressão, ele passava bem. O responsável pelo ato seria um representante de taxistas. A Polícia do Senado não identificou o autor da violência.
99, Cabify e Uber dizem que Senado ouviu a população
Após as mudanças aprovadas pelo Senado Federal, as principais empresas do setor comemoraram o resultado. Segundo o Uber, o Senado “ouviu as vozes dos mais de 500 mil motoristas parceiros e dos 17 milhões de usuários da Uber”. Já o Cabify disse que a Casa “se demonstrou sensível à população diante das emendas de mérito apresentadas na aprovação” da proposta. A 99 afirmou que o resultado da votação foi uma “vitória para a sociedade”.
Em nota, o Uber declarou ainda que, ao apoiar o fim da obrigatoriedade de pontos como o uso da placa vermelha, o Senado retirou “muitas das burocracias desnecessárias propostas”.
Já para a Cabify, o projeto “originalmente inviabilizava a operação de aplicativos de transporte individual em todo o País”. “As manifestações em redes sociais, carreatas e também mais de 825 mil assinaturas contra a aprovação do PLC entregues para o Senado, que pediam a rejeição ao projeto, foram ouvidas pelos senadores. As emendas de mérito que trouxeram um projeto de lei mais equilibrado”, diz a nota da empresa.
“Entendemos que o texto final aprovado pelos senadores é equilibrado. As emendas adicionadas ao projeto garantem mais proteção aos usuários uma vez que exigem seguro de acidentes pessoais e checagem de antecedentes dos condutores. A proposta ainda confere aos municípios o poder de fiscalizar a atividade dos motoristas de carros particulares. A startup está confiante de que o bom senso irá prevalecer e que a Câmara dos Deputados manterá as alterações aprovadas pelo Senado, garantindo a renda dos motoristas particulares e a liberdade de escolha dos cidadãos em todo país”, afirma a nota da 99.
Já o presidente da Associação Brasileira das Associações e Cooperativas de Motoristas de Táxi (Abracomtaxi), Edmilson Sarlo Americano, reclamou que a votação no Senado foi confusa e o acordo era que, por emendas de mérito, se modificasse apenas os dispositivos que tratavam da placa vermelha e propriedade do veiculo, sem que voltasse para a Câmara.
“Como o município vai fiscalizar se as regras se não podem regulamentar o trabalho dos aplicativos? Você só fiscaliza aquilo que você regulamenta. Vamos lutar na Câmara para que isso seja recolocado e que o texto aprovado lá seja retomado na íntegra”, protestou o sindicalista dos táxis. Pelo texto aprovado, os municípios não podem regulamentar, e, sim, fiscalizar o serviço.
Estudo
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) concluiu em um estudo que a entrada de aplicativos de transporte se mostra, em sua maioria, benéfica ao consumidor. Isso porque aumenta a concorrência e ainda possibilita a redução de falhas de mercado. Por isso, alerta o estudo, regulamentações muitos restritivas podem ter efeitos negativos.
Essa é uma nota técnica preliminar de levantamento mais amplo, em elaboração pelo Cade, com previsão de ser concluído ainda em 2017. O texto com as considerações iniciais foi divulgado nesta terça-feira.
Segundo o Cade, essas plataformas propiciaram a correção de falhas no setor sem a necessidade de regulação, permitindo ao consumidor ter acesso prévio a informações da corrida, como previsão do preço, percurso sugerido, duração, avaliação do motorista e modelo do veículo.
Na verdade, defende o estudo, considerando as inovações tecnológicas que são capazes de minimizar as falhas de mercado, faz sentido cada vez menos regulação no setor.
Mas, no Brasil, empresas de aplicativo têm sido acusadas na Justiça de não oferecerem condições adequadas de trabalho a seus motoristas.