O técnico em turismo Rafael Giannotti, de 34 anos, começou há cerca de duas semanas sua peregrinação por agências de emprego. Sem carteira assinada há mais de um ano e meio, ele está em busca de um emprego temporário no varejo na época em que as lojas começam a reforçar seus times para as vendas de Natal, que depois de quedas consecutivas em 2015 e 2016 devem ter desempenho positivo este ano. Giannotti ainda não teve sorte mas, segundo estimativa da Federação Nacional dos Sindicatos de Empresas de RH, Trabalho Temporário e Terceirização (Fenserhtt), as vagas extras este ano devem aumentar 10% e somar 111 mil no comércio. Além disso, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) prevê que 27% dos temporários serão efetivados após o período de festas. Nos últimos dois anos, apenas 15% desses trabalhadores conseguiram se manter em seus postos de trabalho ao fim do contrato.
Com a entrada em vigor da reforma trabalhista, no próximo dia 11 de novembro, o técnico em turismo Giannotti tinha a expectativa de oferta de vagas dentro das novas modalidades de contratação, como o trabalho intermitente. Não foi o que viu na praça:
— Não encontrei agências oferecendo esta nova modalidade de contrato. Por enquanto, só mesmo o contrato temporário. Ainda não consegui vaga, mas estou esperançoso já que a economia está melhorando — diz Giannotti.
Para especialistas, os efeitos da reforma só devem ocorrer a médio prazo. De qualquer maneira, a retomada da economia vai ajudar na abertura de vagas temporárias. A CNC prevê alta de 4,3% nas vendas de Natal este ano, puxadas por setores como vestuário e móveis e eletrodomésticos. As compras do período natalino devem movimentar R$ 34 bilhões até dezembro, estima a CNC.
— Já temos um crescimento das vendas do varejo de 1,9% até setembro. Até dezembro, com a aceleração do Natal, esse desempenho deve ser positivo em 2,8%, depois de quedas de 5%, em 2015 e 4,9% em 2016. O setor de vestuário é um dos que mais vem puxando o varejo e historicamente se beneficia das vendas de Natal, quando seu faturamento chega a dobrar. O setor de vestuário e os hiper e supermercados representam 42% da força de trabalho do varejo e chegam a responder por 60% das vendas no Natal — diz o economista-chefe da CNC, Fábio Bentes.
Ele observa que o cenário está melhor para o varejo com inflação baixa, que aumenta o poder de compra das pessoas. Além disso, o mercado de trabalho começa a se recuperar, e a taxa de juro está recuando nas linhas de crédito ao consumidor.
— O varejo também foi afetado positivamente por um efeito extraordinário da liberação dos recursos do FGTS e agora do PIS/Pasep. Com isso, o setor conseguiu colocar a cabeça para fora da água depois de dois anos de crise — afirma Bentes.
ADIAMENTO DA OFERTA DE VAGAS TEMPORÁRIAS
O economista da CNC observa que a crise da economia levou a um adiamento na oferta de vagas temporárias. Antes da crise, mais de 20% das vagas temporárias eram preenchidas entre setembro e dezembro. Mas, nos dois últimos anos, esse percentual caiu para 15%, de acordo com O Globo.
— A boa notícia é que a reação mais positiva da economia no início de 2018 deverá elevar o percentual de efetivações — diz Bentes.
A Associação Comercial de São Paulo estima um crescimento de 3,5% nas vendas de Natal, enquanto a Federação do Comércio do Rio de Janeiro projeta alta de 3% no faturamento no período. Para Marcelo Solimeo, da ACSP, a Black Friday, em novembro, deve dar um impulso extra às vendas de fim de ano.
— Acreditamos que as vendas da Black Friday cresçam 15%, melhorando o desempenho do varejo neste período de festas — diz Solimeo, que acredita que muitas pessoas usaram o FGTS para limpar o nome, pagando dívidas atrasadas, e devem voltar a contrair dívidas no fim de ano.
Bentes, da CNC, acredita que em 2018 o cenário para emprego será mais positivo também graças à flexibilização nos modelos de contratos de trabalho previstos na reforma trabalhista. Vander Morales, presidente da Fenserhtt, acrescenta que, apesar da reforma entrar em vigor no dia 11, ainda há muitas incertezas no mercado.
— Há muita insegurança das empresas em oferecer as novas modalidades de contrato, como o trabalho intermitente. O que está assustando o varejo é o fato de a Justiça do Trabalho estar contestando o texto da reforma com a elaboração de uma cartilha de novas regras. Ninguém sabe que regras seguir — explica.
Há duas semanas, a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) divulgou uma espécie de cartilha sobre a reforma trabalhista, contestando com 125 proposições o texto aprovado em julho pelo Congresso. Na prática, o documento divulgado pelos juízes formaliza um posicionamento contrário à reforma. Na cartilha, por exemplo, os juízes apontaram a ilegalidade do uso da jornada intermitente de forma indiscriminada. Eles entendem que essa modalidade de contrato deve se restringir apenas “às atividades de caráter intermitente”.
— Acredito que cabe à Justiça do Trabalho aplicar a lei aprovada no Congresso. Mas, com esse impasse, as novas modalidades de contrato trazidas pela reforma não vão entrar em vigor neste Natal, o que é negativo, já que várias opções atendem melhor às necessidades do varejo. O contrato de trabalho intermitente é muito interessante. O lojista poderá dimensionar melhor os períodos e o número de horas em que vai precisar reforçar a mão de obra — diz Marcel Solimeo, economista da Associação Comercial de São Paulo.
DÚVIDAS SOBRE TRABALHO INTERMITENTE
Por essa modalidade de contratação, o empregado fica à disposição do empregador, que o chama quando houver mais necessidade. As empresas podem contratá-lo para trabalhar por horas, dias ou meses e pagá-lo apenas pelo período em que prestou seus serviços, flexibilizando as relações de trabalho. Assim como os temporários, os intermitentes também têm direito aos benefícios da Previdência e FGTS e devem ser contratados por intermédio de uma agência de empregos. Mas é exatamente esse contrato de trabalho intermitente que está causando insegurança entre os varejistas, diz Vander Morales, da Fenserhtt.
— A modalidade intermitente foi incluída na categoria dos temporários. Mas enquanto o contrato temporário tem prazo limitado (subirá de 180 dias para 270 dias com a reforma), o intermitente, não. Além disso, os temporários devem ganhar o piso salarial da categoria, benefício que também deverá ser estendido aos intermitentes. O temor é que haja confusão na Justiça envolvendo os contratos intermitentes. Por isso, a opção deve ser pelo contrato temporário, que já está consolidado — explica.
O advogado Carlos Eduardo Vianna Cardoso, sócio do setor trabalhista do escritório Siqueira Castro Advogados, também concorda que os benefícios da reforma trabalhista não serão sentidos logo após sua entrada em vigor. Ele avalia que as novas modalidades de contrato trazidas pela reforma só devem ser colocadas em prática em um ou dois anos.
— Neste ano, a reforma não deve ter impacto no aumento de contratações com essas novas modalidades de contrato — diz Cardoso.